Em meu artigo da edição passada deste “Jornal da Cidade” (12/11), fiz uma abordagem sobre o questionamento do resultado das eleições presidenciais por parte de bolsonaristas inconformados com a derrota do Capitão, a primeira de um presidente incumbente em busca da reeleição na história de nosso país. Sem nenhuma surpresa, constato que teses mirabolantes (e totalmente sem base legal e técnica) continuam circulando por aí, na tentativa de, ao menos, tumultuar o ambiente político nesse momento pós-eleição.
Primeiro é bom lembrar que se passaram quase quatro semanas das eleições de segundo turno, e Bolsonaro já quebrou outro tabu: é o primeiro presidente da república da história que deixa de governar o país logo após a decretação do resultado do pleito. Desde antes do dia 30 de outubro, ele não toma nenhuma decisão importante para o país como chefe do poder executivo, e mal aparece no Palácio do Planalto para despachar. Quem praticamente governa o país desde então, é o presidente eleito Lula e seu vice Alckmin, que é o responsável por coordenar a transição de governo, e já negocia o orçamento e a base de apoio com o atual e com o futuro congresso.
Nas duas últimas semanas, algumas teses conspiratórias foram aparecendo e sumindo com a rapidez de um meteoro, e um efeito colateral vem sendo gerado desde então: as movimentações do bolsonarismo radical contra a vitória de Lula nas eleições, passaram a ser motivo de memes e piadas. Sejam os acampamentos em frente aos batalhões militares, os poucos bloqueios ilegais em estradas, os pedidos de intervenção militar (pedido de socorro, nas palavras deles), o relatório inconclusivo das Forças Armadas, o discurso contra a ameaça do “comunismo”… tudo virou chacota. Até um ministro do STF, ao ser importunado por um bolsonarista, saiu-se espontaneamente com essa: “Perdeu mané, não amola!”
A “grande jogada” desta semana foi um pedido do PL, partido de Bolsonaro, apresentado junto ao Tribunal Superior Eleitoral, pedindo a invalidação de votos computados em 279 mil urnas no segundo turno da eleição presidencial, sob a alegação de irregularidades em modelos de urnas eletrônicas anteriores a 2020, cujos logs (identificação eletrônica) teriam apresentado um “número repetido”, que impossibilitaria a realização de conferência de votos naqueles equipamentos. Em resumo, a conclusão do estudo foi essa.
O tal “estudo” foi feito por uma empresa particular – o Instituto Voto Legal -, contratada pelo Partido Liberal, e anexado a um pedido que o partido formalizou junto ao TSE requerendo a anulação dos votos depositados nas urnas questionadas, somente na votação do segundo turno, esquecendo-se, convenientemente, que as urnas foram as mesmas utilizadas no primeiro turno, o que influenciaria nas eleições de deputados, senadores e governadores. De pronto, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, determinou que por coerência, fosse incluído pedido de anulação também relativo à votação do primeiro turno na petição, o que causou um alvoroço nos bolsonaristas eleitos no primeiro turno nos estados e para o congresso. O PL não cumpriu a determinação, e o TSE aplicou-lhe uma multa de 23 milhões de reais por litigância de má-fé.
Não bastasse isso, tecnicamente o tal estudo também era cheio de incorreções. O professor Ivar Hartman, professor e pesquisador do Insper, ex-coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e doutor em Direito Público pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) afirmou que a falha no campo “ID_UE” não impede a identificação das urnas, como sugere o estudo apresentado. Isso porque o log da urna possui vários campos, como município, zona, seção, local de votação, código de carga da urna e identificação da mídia da carga. Seria possível fazer um cruzamento de dados para identificar todos os equipamentos. “O conjunto deles forma uma chave única”, afirmou o professor. Nesse momento, o tal “estudo” já não parava mais em pé, e mais uma tese mirabolante virou… piada! Todos, com exceção do pessoal que viaja em para-brisa de caminhão, faz oração com o celular na testa e canta hino para pneu, já sabiam que essa ação não ia dar em nada e serviria apenas para atiçar o bolsonarismo, mantendo-o mobilizado nas ruas por mais algum tempo.
É certo que até o próximo dia 1º de janeiro, quando o presidente eleito Lula subir a rampa do Planalto para tomar posse, outras teorias da conspiração irão aparecer (e sumir) aqui e acolá, e teremos uma Copa do Mundo, um Natal e Reveillon com muito assunto pra nos divertir sobre o tema “eleições 2022”. E por falar em subir a rampa, ainda resta uma dúvida: Quem irá passar a faixa presidencial a Lula? Será a simpática ema do Alvorada?