Minas Gerais sempre teve um protagonismo destacado na política nacional, tanto que uma regra eleitoral persiste desde o início da nossa república: quem vence a eleição presidencial, sempre vence a disputa dentro do estado de Minas. Um dos motivos certamente é o fato de que Minas não se “regionalizou”, e possui características de todo Brasil. Do desenvolvimentismo do Triângulo Mineiro ao agronegócio da Zona da Mata e Sul de Minas, das grandes mineradoras do Vale do Aço passando pela pujança da região metropolitana de BH até chegar à agricultura familiar do Vale do Jequitinhonha. Não tem mar, mas Furnas consegue suprir a falta de uma praia, tranquilamente.
Exatamente por ser esse “microcosmo” brasileiro, é que pegou tão mal as falas do governador Romeu Zema (Novo) em entrevista ao jornal “O Estado de São Paulo” na edição do último dia 05 de agosto, quando pregou a necessidade de “aumentar o protagonismo do Sul e do Sudeste frente ao Norte e Nordeste, o que indicou um movimento de tensionamento entre as regiões do país. Em determinado momento da entrevista, Zena usou a seguinte frase:
“(…) Então Sul e Sudeste vão continuar com a arrecadação muito maior do que recebem de volta? (…) Se não você vai cair naquela história, do produtor rural que começa só a dar um tratamento bom para as vaquinhas que produzem pouco e deixa de lado as que estão produzindo muito. Daqui a pouco as que produzem muito vão começar a reclamar o mesmo tratamento.”
Zema, mais uma vez, errou feio. E não é a primeira vez (nem a segunda) que faz comentários preconceituosos e xenofóbicos. Durante o 8º Encontro da Cossud (o tal Consórcio Sul-Sudeste), em junho passado, ele já havia soltado a seguinte pérola de finíssima economia política:
“Temos aqui uma semelhança enorme. Se tem estados que podem contribuir para esse país dar certo, eu diria que são esses sete Estados aqui [das regiões Sul e Sudeste]. São Estados onde, diferente da grande maioria, há uma proporção muito maior de pessoas trabalhando do que vivendo de auxílio emergencial”.
Nada republicano, não é mesmo? A ideia de isolar o Norte e Nordeste do restante do país fez história no governo Bolsonaro, e como resultado, ajudou Lula a voltar ao poder. Parece que Zema não aprendeu nada nesse tempo de lá pra cá.
Tivesse sido um pouco mais “mineiro”, ponderado melhor, provavelmente teria percebido que essa pauta de contrapor Sul/Sudeste ao Norte/Nordeste, é um presente dos sonhos para Lula. Com isso, Zema, a exemplo de Bolsonaro na eleição passada, forneceu o argumento desejado para o sentimento nordestino, nortista e dos pobres do país de que só Lula os defende, só ele tem de fato uma agenda para a diminuição da desigualdade regional e que só Lula e a esquerda fizeram uma opção preferencial pelos pobres.
Zema foi tão mal na entrevista, que recebeu críticas tanto à esquerda e centro esquerda, quanto de importantes representantes da direita, como o ex-ministro bolsonarista Gilson Machado (PL-PE), que repudiou veementemente qualquer fala que se refira a separação do país.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), que é mineiro, somou-se ao coro de vozes críticas à Zema, e soltou uma nota oficial pelas redes sociais:
“Não cultivamos em Minas a cultura da exclusão. Juscelino Kubitschek, o mais ilustre dos mineiros, ao interiorizar e integrar o Brasil, promoveu a lógica da união nacional. Ao valoroso povo do Norte e Nordeste, dedico meu apreço e respeito. Somos um só país”.
Todos que acompanham a política nacional sabem que Romeu Zema tem intenção de candidatar-se à presidência da república em 2026. Seu marqueteiro político com certeza vai ter trabalho. Primeiro para lembrar que Norte e Nordeste possuem, juntos, mais de 31% do eleitorado nacional, em números do TSE em 2022, e segundo, para deixar-lhe claro que o eleitor, cada vez menos apoia o discurso do “nós” contra “eles”, e que a busca pelo diálogo e ponderação é melhor para todos, inclusive para a economia e o bolso do trabalhador.
Por enquanto, Zema vai como peixe, morrendo pela boca. Do mesmo jeito que fazia seu recente Guru e Messias, que também falava pelos cotovelos e não estava nem aí para o Nordeste. Deu no que deu.