Após o segundo turno da eleição presidencial do ano passado, confirmada a vitória de Lula frente a Bolsonaro, deu-se início nas mídias digitais, por parte de bolsonaristas radicais, à um verdadeiro culto a uma popular onomatopeia conhecida mundo afora: o “tic-tac”.
Esse “tic-tac” dos bolsonaristas sinalizava que o tempo estava passando, e que logo teríamos novidades sobre o futuro da presidência da república, e que essa novidade não contemplava Lula no Palácio do Planalto à partir de 1º de janeiro de 2023, conforme o resultado das urnas, e o regular cumprimento da Constituição Federal.
O primeiro “tic-tac” criado foi logo após o segundo turno, quando circulou pela internet a fake news que dizia que se em cinco dias houvesse um questionamento da lisura das eleições, pelo exército ou pela OAB por exemplo, a votação poderia ser anulada. Mas nada disso ocorreu, até porque essa possibilidade não existe.
Surgiu então o segundo “tic-tac”, aquele que colocava em xeque a diplomação de Lula. Eis que o dia 12 de dezembro chegou, e Lula recebeu o diploma de eleito, na sede do TSE em Brasília. Sem desanimar, os bolsonaristas criaram a terceira versão do “tic-tac”, desta vez para a posse no dia 1º de janeiro. “Não subirá a rampa!” – bradavam os patriotas. E assim Lula subiu a rampa acompanhado de vários representantes de nossa sociedade, e mais um “tic-tac” foi para o brejo.
Mas os “tic-tac’s” não sumiram, e os patriotas acampados frente aos quartéis tinham convicção que algo estava por acontecer, que mudaria a história das eleições, e recolocaria Bolsonaro no poder, com o apoio dos militares. Lula, Janja, Alexandre de Moraes, e todo o restante da esquerda, logicamente seriam presos. Nesse caso o “tic-tac” até funcionou, mas durou apenas uma tarde de domingo, quando um bando de desmiolados invadiu e depredou a praça dos três poderes em Brasília. Na manhã do dia seguinte, a realidade caiu como um meteoro, e mais de 1.500 golpistas foram levados de ônibus para serem fichados e presos.
Pois bem. Passados mais de sete meses desde o banho de realidade que os bolsonaristas radicais levaram, as investigações da Polícia Federal enfim revelaram o que realmente significavam tantos “tic-tac’s”: tratava-se do inconfundível som de um Rolex em ouro branco, cravejado de diamantes e mostrador de madrepérola, avaliado em mais de 350 mil reais.
Segundo as investigações, Bolsonaro liderou um esquema de venda de bens públicos pertencentes ao acervo da presidência, que pode ter lhe rendido alguns milhões de reais. Desse esquema, participaram servidores públicos, militares, assessores diretos, o advogado Wassef e até a primeira dama tinha conhecimento dos negócios irregulares. Tudo descoberto à partir da quebra do sigilo telemático do ajudante de ordens da presidência e fiel escudeiro de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid.
Os fatos caíram como uma bomba para Bolsonaro, que despencou mais de 20 pontos no Índice de Popularidade de Digital (IPD) medido pela Quaest na semana passada (veja aqui: https://www.brasil247.com/poder/popularidade-de-bolsonaro-nas-redes-despenca-apos-escandalo-do-desvio-de-joias-aponta-quaest). Ele perde simpatizantes principalmente entre homens na faixa de 40-60 anos, evangélicos, moradores da região Norte e Sul.
Na direção contrária, o mesmo instituto Quaest divulgou pesquisa em 16 de agosto que mostra o crescimento da avaliação positiva do governo Lula (veja aqui: https://www.cnnbrasil.com.br/politica/pesquisa-quaest-42-avaliam-positivamente-o-governo-lula-gestao-e-negativa-para-24/). Analistas de pesquisas não tem dúvida em afirmar que essa avaliação do governo Lula melhorou mais pela divulgação das denúncias contra Bolsonaro do que pela evolução na gestão da presidência.
Não há como negar que Bolsonaro está passando pelo seu pior momento em toda sua trajetória política. Investigado em várias frentes, com sigilos quebrados, sem foro privilegiado, e com aliados (ou cúmplices) que deixaram rastros de crimes cometidos por todos os lados, o capitão está acuado e vendo vários antigos aliados sumirem.
A realidade é que hoje ele carrega consigo no seu dia a dia, aquela sensação de ouvir intermitentemente um conhecido, e para ele angustiante som: “tic-tac, tic-tac, tic-tac…”