MOYSÉS DE OLIVEIRA
Moysés de Oliveira nasceu de parteira na cidade de Batatais no 14 de março de 1937, filho de José de Oliveira e de Maria do Carmo de Oliveira. Ele pedreiro; ela costureira e dona de casa. Tinha mais 6 irmãos, sendo um de criação quase da idade de Moysés, que era o 3º filho. Os filhos são: Maria José, Maria do Carmo, Moysés (o nosso biografado – falecido), Mário (falecido), Maria Luiza, Benedito (falecido) e Daniel (irmão caçula, hoje com 72 anos).
A família sempre morou no Riachuelo. Teve por avós paternos, Arthur Lopes de Oliveira – conhecido construtor – e Luiza Ferreira Lopes. Moysés de Oliveira era um dos sobrinhos do renomado jogador de futebol da década de 30, Zeca Lopes.
Aos 7 anos, ingressou no Grupo Escolar Washington Luís, onde concluiu o 4º ano primário, atual 5º ano do Ensino Fundamental.
Aos 14 anos iniciou sua vida profissional ao lado de seu pai, tornando-se um excelente pedreiro. Não conheceu o avô paterno, Arthur Lopes, porém perpetuou uma tradição familiar, ser construtor. Como narra uma de suas filhas, Eleusa, “fez de tudo relacionado à construção de uma casa: carpinteiro, marceneiro, encanador, eletricista etc”. Como marceneiro orgulhava-se da confecção de peças que fez para laboratórios de Física e Matemática de colégios de Ribeirão Preto sob a supervisão do professor Júlio Abdala.
Casou-se aos 21 anos, em 17 de janeiro de 1959, com Helena Martins da Silva Oliveira, de 17 anos de idade. Ainda assim deu tempo para o namoro na Praça da Matriz e no cinema. Helena também morava em casa de familiares no mesmo bairro que Moysés, o Riachuelo. Seus pais residiam na zona rural da cidade. O casal teve 3 filhos: Eleusa, Eloísa e Evandro. Seria hoje avô de 5 netos e 3 bisnetos.
Em busca de maior estabilidade financeira, aos 28 anos ingressou no Instituto Agrícola de Menores de Batatais (IAMB) para o cargo de Inspetor de Alunos; porém, suas inúmeras habilidades na construção civil foram aproveitadas na Oficina de Manutenção da referida unidade educacional durante 35 anos, até sua aposentadoria. Foi no trabalho que ganhou dois apelidos ‘Fela’ e ‘Samuel’.
Durante este período trabalhou nas duas unidades existentes em Batatais, primeiro no espaço do próprio IAMB e depois no Lar da Infância. “Meu pai trabalhou no Lar da Infância quando o espaço era Secretaria da Assistência Social num dos projetos desenvolvido pela Prefeitura. Ele foi locado pela Secretaria do Menor assim que o contrato com a Febem foi extinto, até a sua aposentadoria”, explica sua filha Eleusa.
“Meu pai, sempre foi muito especial, sempre foi muito humano com os meninos do IAMB, muitos chegaram a frequentar nossa casa. Meu pai sabia que o futuro daqueles meninos dependia do estudo e principalmente da profissionalização daqueles jovens”, rememora Eleusa.
Ainda em vida, foi lindamente homenageado pela unidade de Batatais do IAMB na gestão do Sr. Dagmar Martins de Moura, graças aos anos de dedicação ao trabalho. A Casa Abrigo local recebeu seu nome, assim denominada: Casa Abrigo Moysés de Oliveira. “A Casa Abrigo teve seu início na Febem, depois veio para o Lar da Infância, e depois em casas na comunidade e retornou para a Febem”, relata Eleusa.
As habilidades manuais lhe trouxeram outros prazeres. Como artesão participou dos carnavais das escolas de samba da Febem e Riachuelo na confecção dos carros alegóricos. Tornou-se um artista plástico destacado com suas esculturas em madeira, sendo suas obras conhecidas na região. Uma delas, batizada de ‘Cruz da União’, está exposta ao público no salão paroquial da Igreja Nossa Senhora de Fátima. O artista Moysés de Oliveira tem peças, inclusive, em outros países. Seus netos estão finalizando algumas obras inacabadas do avô artista.
Não era uma pessoa muito expansiva, sempre muito discreto, não abria mão de usar roupas claras. Ainda assim seu Moysés e dona Helena abrilhantaram diversas vezes os bailes da Princesa Isabel e da Pró-Arte. A paixão do casal pela dança era tamanha que levava as filhas já adultas para os bailes. Gostava de ver a família reunida, principalmente em torno de uma mesa farta de comida; “adorava uma ‘carne mal passada’ e pizza”. O gosto pela dança e a boa forma do sr. Moysés fez com que nas formaturas de todas as netas, a segunda valsa fosse com ele, inclusive nas graduações. “Foram momentos esperados e celebrados por todas as netas”, conforme relatou Eleusa.
Moysés participou ativamente da Associação dos Artesãos de Batatais e como ‘saudosista’ nato, gostava de ouvir e cantar suas músicas preferidas, tendo seus programas de rádio e TV favoritos. Era bem eclético quando o assunto era música. Tinha um gosto musical bem eclético: gostava de samba, boemia e rock. Um dos cantores que o fazia cantar emocionado era Althemar Dutra. Foi fã de Raul Seixas.
No rádio aos domingos, o programa Alô Saudade comandado pelo radialista Oswaldo Batista era sagrado; além dos jogos de futebol, de preferência os jogos do Corinthians, do qual era torcedor ‘roxo’. Na juventude jogou futebol de várzea. Na TV, podemos chamá-lo de noveleiro, além de assistir aos tradicionais programas musicais e esportivos. “Em casa adorava acompanhar as músicas tocadas no rádio e na TV cantando junto com os músicos”.
Faleceu aos 81 anos, no dia 31 de maio de 2018, depois de um longo sofrimento, acometido por doença fatal.
Também foi homenageado em vida durante a Semana da Consciência Negra, no ano de 2015.
ISOEL APARECIDO DA SILVA
Isoel Aparecido da Silva, conhecido como Isoel da Vila, nasceu em Batatais no dia 10 de junho de 1940. Foi o segundo filho do benzedor José Galdino da Silva e da lavadeira Maria Angelina da Veiga e Silva. Tinha mais 8 irmãos. Estão vivos: Rinaldo (Nardão) e Sônia.
Na infância e juventude intercalou sua morada junto aos pais entre a cidade e a zona rural. Na cidade, morou nos bairros da Cachoeira, do Riachuelo, do Santo Antônio e na Vila São Francisco.
Estudou na Escola Rural onde tirou o diploma da antiga 4ª série normal. Aos 18 anos fez o Tiro de Guerra.
Como afirma a família, “ainda menino, Isoel despertou o gosto pela música, principalmente pelos instrumentos de percussão, qualquer lata de banha ou marmelada que a mãe desocupava já se transformava em instrumento musical” Continuam: “Aos 13 anos veio com o pai na cidade e encontrou uma carcaça de violão, limpou, lixou e pregou umas placas de fórmica que fez a mãe pedir para um marceneiro; e esticou fios de pesca e assim tirar seus primeiros acordes”. Neste momento há o despertar do instrumentista autodidata que tocava gaita, piano, flauta, pandeiro, cuíca e todos os instrumentos de percussão, sem conhecer ao menos uma nota musical.
Juntamente com a música, Isoel da Vila aprendeu a profissão de pedreiro. “Como era muito curioso, levava para casa pedaços de pedra e resto de massa de cimento e aprendeu com sua curiosidade a arte do mosaico, fazer carimbos no cimento e assentamento de pedras. Assim, como pedreiro, conhecedor da arte mosaica e sabedor de cantaria, realizou diversos trabalhos em Batatais e região. Chegou a trabalhar em Brasília” afirmou uma de suas filhas, a artista plástica Naif, Con Silva. Em Batatais, deixou sua arte em mosaico registrada em várias casas e lugares. Agregou com seu mosaico os trabalhos do engenheiro Carlos Zamboni e do artista plástico Bassano Vaccarini.
O jovem Isoel mesmo com sua árdua profissão, nunca abandonou a música. Na juventude chegou a tocar na Orquestra de Franca e até quando deu ‘conta’ se apresentou e tocou nos bailes de carnaval, em rodas de samba, além de acompanhar por anos a caravana do ‘Bailão do Batista’, comandada pelo radialista Oswaldo Baptista. Sua filha Maria Cristina conta: “(…) “lembro, eu bem pequena ainda, do pai tocando nos shows que os circos organizavam em Batatais. O ‘Circo do Bira’ foi um deles”. Maria Cristina, a filha mais velha de Isoel da Vila, carrega o título de 1ª Porta-Bandeira da Acadêmicos do Samba. Atualmente, Maria Cristina e uma das filhas são integrantes do grupo musical de afro-reggae local Que bloco é Esse?
Conheceu sua primeira esposa, Benedita Motta da Silva em Nuporanga, cidade vizinha a Batatais, quando lá trabalhava. Casaram-se no início dos anos 60, e assim permaneceram por 28 anos. Dona Benedita foi companheira de seu Isoel na luta para amenizar o estado de pobreza em que viviam e dar uma boa orientação aos filhos. Seu Isoel foi pedreiro e Dona Benedita, trabalhadora rural. Tiveram três filhos, que desde cedo seguiram os passos do pai sambista e artista, e têm a força e resistência da mãe. São eles: Tone (falecido), Maria Cristina e Con Silva, que continuam exercendo atividades ligadas à arte, à dança, à música, à resistência e luta do povo negro; todos sambistas.
Isoel da Vila foi músico, intérprete e compositor de samba. Um artista nato, sensível e completo.
“Tocou em todos os desfiles de 60 a 78, na bateria da Escola de Samba Flor de Maio, depois Escola de Samba Princesa Isabel e nos bailes de carnaval do Clube Princesa Isabel”, relata Maria Cristina. Com o término da primeira escola do coração, fundou com seu irmão Rinaldo Aparecido da Silva (Nardão) e outros dois amigos, a Escola de Samba Grêmio Recreativo Acadêmicos do Samba em 1979. Aprenderam a fazer de tudo um pouco para realizar o sonho de desfilar. Nas palavras de um dos quatro amigos, fundadores da Acadêmicos do Samba, Sebastião Carlos Rodrigues sobre o carnaval de 1979: “Foi um desafio, conseguimos colocar a Escola pra desfilar em menos de trinta dias”.
Como compositor, Isoel da Vila merece este destaque: “Todas as vezes que a Acadêmicos do Samba foi campeã do carnaval de rua de Batatais, as composições foram do meu pai Isoel juntamente com seu Pedro Lázaro Teixeira”, relembra Maria Cristina.
Isoel da Vila em suas composições e melodias teve parceiros como o jornalista Pedro Lázaro Teixeira, Paulinho Mirandinha, Nelson Valério e Renan ‘do Cavaco’. Além da escola de samba, formou também com o amigo Sebastião Carlos Rodrigues e outros parceiros, o pioneiro grupo de samba denominado Varanda de Frente, e durante 10 anos o grupo tocou em eventos e bailes.
Foi num desses bailes que conheceu sua segunda companheira, Dona Irene Deltoso, na década de 90.
Teve a oportunidade de eternizar com sua voz, uma de suas composições mais conhecidas, Pagode da Comadre, quando da gravação de um disco coletivo, o LP Gente Nossa, organizado pelo médico, músico e estimado amigo pessoal de Isoel da Vila, Dr. Said Miguel Júnior. O LP Gente Nossa buscou registrar composições e músicos da cidade de Batatais. “Lembro do meu pai receber amigos importantes dentro de casa. Um deles foi o Dr. Said que chegou a comer algumas vezes paçoca com pinga na beira do fogão de lenha de casa” conta Con Silva.
No carnaval de 1989, Isoel da Vila estava muito emocionado durante o desfile da Acadêmicos do Samba que naquele ano desceu a Avenida Nove de Julho com o enredo “Clara Guerreira, Mulher e Saudade” de Geralda Ribeiro, homenageando a cantora Clara Nunes, uma das grandes paixões de Isoel. A sua emoção foi ao extremo, o que acabou num infarto ao final da passarela. Graças ao amigo e parceiro de samba Sebastião Carlos Rodrigues que percebeu algo diferente, foi socorrido mais a tempo.
“Amanhecemos todos fantasiados na porta da Santa Casa de Ribeirão Preto. Meu pai fez uma cirurgia que durou 7 horas. Foram 3 pontes safenas e 2 mamarias. A hora que voltou da anestesia me perguntou o que eu estava fazendo lá?! Era para eu ir embora para desfilar… E também tem uma curiosidade foi o primeiro vez que Jamelão assumiu oficialmente como intérprete. No primeiro dia ele cantou com meu pai, no segundo dia meu pai estava internado e Jamelão se revelou e puxou o samba sozinho. Deu um show!”, relembra saudosa e chorosa uma das filhas, Con Silva.
Depois disso Isoel da Vila nunca mais desfilou. Porém, não abandonou o samba. Continuou a compor, incentivar seus filhos e amigos a participarem, mas ouvia a sua Acadêmicos do Samba de longe.
Recebeu em vida algumas justas homenagens: pelo seu trabalho como músico. Ganhou o troféu Clube da Viola e em 2003, nas comemorações do centenário do pintor Cândido Portinari foi homenageado em Brodowski pelo próprio filho do pintor, João Cândido Portinari, pela composição do samba em homenagem ao pai.
Isoel da Vila, alusão ao sambista Martinho da Vila, despediu-se desta vida em 27 de maio de 2011. Deixou forte descendência que perpetua seu legado de homem simples, honrado, ético, artista e sambista.
Em junho de 2015, por indicação do vereador João Bosco, o Bosquinho, seu nome foi eternizado num logradouro público no bairro Francisco Pupin, como Praça Isoel Aparecido da Silva (Isoel da Vila), o que deixa muita honrada a família. A Praça Isoel da Vila fica entre as Ruas Itamar Pereira Lima, dos Lírios e Avenida Pedro Paulo Fernandes.
Agradecemos e nos sentimos honradas pela confiança dos depoentes – familiares e amigos – que se dispuseram a abrir um pouco de seus baús de memórias com narrativas vivas de suas histórias familiares para compartilhar tão lindamente a trajetória dos biografados com nossos leitores.
O apoio da comunidade foi e é essencial para o aprofundamento do projeto TERRITÓRIOS E TERRITORIALIDADES DO POVO PRETO EM BATATAIS – INVENTÁRIO CULTURAL realizado pelo Museu Histórico e Pedagógico ‘Dr. Washington Luís’.
Nossa Gratidão! Muito Axé a todos!!!
Até a próxima.