Fica a Dica!
A crônica que trago hoje foi escrita ppor Lima Barreto e publicada no livro Vida Urbana. Lima Barreto, diferente de cronistas que enalteciam as vertiginosas transformações urbanas que tomavam conta do Rio no início do século XX, optou por uma postura crítica em relação ao projeto modernizador que passou a ser implementado na cidade.
A volta
O governo resolveu fornecer passagens, terras, instrumentos aratórios, auxílio por alguns meses às pessoas e famílias que se quiserem instalar em núcleos coloniais nos Estados de Minas e Rio de Janeiro.
Os jornais já publicaram fotografias edificantes dos primeiros que foram procurar passagens na chefatura de polícia.
É duro entrar naquele lugar. Há um tal aspecto de sujidade moral, de indiferença pela sorte do próximo, de opressão, de desprezo por todas as leis, de ligeirezas em deter, em prender, em humilhar, que eu, que lá entrei como louco, devido à inépcia de um delegado idiota, como louco, isto é, sagrado, diante da fotografia que estampam os jornais, enchi-me de uma imensa piedade por aqueles que lá foram como pobres, como miseráveis, pedir, humilhar-se diante desse Estado que os embrulhou.
Porque o Senhor Rio Branco, o primeiro brasileiro, como aí dizem, cismou que havia de fazer do Brasil grande potência, que devia torná-lo conhecido na Europa, que lhe devia dar um grande exército, uma grande esquadra, de elefantes paralíticos, de dotar a sua capital de avenidas, de boulevards, elegâncias bem idiotamente binoculares e toca a gastar dinheiro, toca a fazer empréstimos; e a pobre gente que mourejava lá fora, entre a febre palustre e a seca implacável, pensou que aqui fosse o Eldorado e lá deixou as suas choupanas, o seu sapé, o seu aipim, o seu porco, correndo ao Rio de Janeiro a apanhar algumas moedas da cornucópia inesgotável.
Ninguém os viu lá, ninguém quis melhorar a sua sorte no lugar que o sangue dos seus avós regou o eito. Fascinaram-nos para a cidade e eles agora voltam, voltam pela mão da polícia como reles vagabundos.
É assim o governo: seduz, corrompe e depois… uma semicadeia.
A obsessão de Buenos Aires sempre nos perturbou o julgamento das coisas.
A grande cidade do Prata tem um milhão de habitantes; a capital argentina tem longas ruas retas; a capital argentina não tem pretos; portanto, meus senhores, o Rio de Janeiro, cortado de montanhas, deve ter largas ruas retas; o Rio de Janeiro, num país de três ou quatro grandes cidades, precisa ter um milhão; o Rio de Janeiro, capital de um país que recebeu durante quase três séculos milhões de pretos, não deve ter pretos.
E com semelhantes raciocínios foram perturbar a vida da pobre gente que vivia a sua medíocre vida aí por fora, para satisfazer obsoletas concepções sociais, tolas competições patrióticas, transformando-lhes os horizontes e dando-lhes inexeqüíveis esperanças.
Voltam agora; voltam, um a um, aos casais, às famílias para a terra, para a roça, donde nunca deviam ter ido para atender tolas vaidades de taumaturgos políticos e encher de misérias uma cidade cercada de terras abandonadas que nenhum dos nossos consumados estadistas soube ainda torná-las produtivas e úteis.
O Rio civiliza-se!
Poesia: o velho abrigo da alma
Os Morcegos
Lêdo Ivo
Os morcegos se escondem entre as cornijas
da alfândega. Mas onde se escondem os homens,
que contudo voam a vida inteira no escuro,
chocando-se contra as paredes brancas do amor?
A casa de nosso pai era cheia de morcegos
pendentes, como luminárias, dos velhos caibros
que sustentavam o telhado ameaçado pelas chuvas.
“Estes filhos chupam o nosso sangue”, suspirava meu pai.
Que homem jogará a primeira pedra nesse mamífero
que, como ele, se nutre do sangue dos outros bichos
(meu irmão! meu irmão!) e, comunitário, exige
o suor do semelhante mesmo na escuridão?
No halo de um seio jovem como a noite
esconde-se o homem; na paina de seu travesseiro, na luz
do farol
o homem guarda as moedas douradas de seu amor.
Mas o morcego, dormindo como um pêndulo, só guarda
o dia ofendido.
Ao morrer, nosso pai nos deixou (a mim e a meus oito
irmãos)
a sua casa onde à noite chovia pelas telhas quebradas.
Levantamos a hipoteca e conservamos os morcegos.
E entre as nossas paredes eles se debatem: cegos como nós.
Nas trilhas da Educação…
1. Aprovados no SISU – Sistema de Seleção Unificada – têm de 13/07/2022 até o dia 18 para fazer matrícula.
2. Começou na quarta-feira dia 06/07/2022 o período de inscrição para os candidatos que desejem entrar na lista de espera do Sisu 2022.06/07/2022 – A manifestação de interesse deve ser realizada até 18 de julho no Portal Acesso Único.