No mês em que completa oficialmente 80 anos de sua existência, trazemos aos leitores um levantamento sobre os primórdios do “AERO CLUBE DE BATATAIS” (Ae.C.B.). No dia 03 de março de 1942, um número significativo de representantes da elite batataense, reunidos na Sociedade 14 de Março fundaram o Ae.C.B.
Desde seu início, o Aeroclube contou com apoiadores e sócios ativos, como o advogado José Arantes Junqueira – também ex-prefeito e ex-deputado estadual; o advogado e memorialista, Dr. Jesus Machado Tambellini; o engenheiro, Carlos Zamboni; o advogado, Dr. Sebastião Martins de Macedo; o comerciante, Arturo Scatena; o comerciante, Antônio Jorge Iunes Abeid; o delegado, Dr. Hugo Ribeiro da Silva; o médico, Dr. Jorge Nazar; o industrial, Anselmo Testa e diversos fazendeiros, como Domingos Queiroz de Morais, Durval Costa Machado, capitão José Martins de Barros e João Cândido Alves Filho entre outros. Na ampla lista dos primeiros sócios-fundadores, consta o nome de três mulheres: Leonor Scatena, Isolina Baldijão Seixas e Olga de Mello Silva.
O dia 27 de novembro de 1941 é citado em alguns textos como o dia da fundação do Ae.C.B., no entanto, esta data marca a promessa de apoio à fundação de um clube aéreo para a cidade de Batatais pelo Secretário da Agricultura do Estado de São Paulo, o então batataense Dr. Paulo de Lima Corrêa, durante uma visita oficial a Batatais. Essa promessa foi fundamental para a rápida organização do aeroclube há tempos desejado por um grupo de amantes da aviação na cidade. A data supracitada pode ser considerada um dos marcos iniciais da história do Ae.C.B., mas não se trata da inauguração oficial. Outra data significativa encontrada em algumas referências como sendo o dia da fundação do Ae.C.B. é o 02 de abril de 1942, dia da aprovação dos seus estatutos pelos sócios-fundadores.
Vale pontuar que a fundação do Ae.C.B. na década de 40 não é algo isolado no cenário nacional e mundial. O surgimento da entidade aeroesportista local corresponde aos fomentos e propagandas da Campanha Nacional de Aviação (CNA) – ou Campanha Nacional para Doar Aviões, principalmente durante os anos que Salgado Filho foi Ministro da Aviação no período do Estado Novo (1937-1945) nos esforços para criar uma rede aérea brasileira civil e militar. Além dos esforços de âmbito federal, o governo de Estado de São Paulo também possuía sua própria campanha, a Campanha de Aeronáutica Paulista (CPA) em sintonia com a campanha federal.
As ações da CNA são consideradas as bases da Aviação Nacional ao incentivar a criação de entidades aviatórias pelo país, a criação de pistas de pouso, a formação de pilotos civis e de mão-de-obra nacional especializada entre outras. A CNA buscou dar apoio incondicional às cidades que intencionassem abrir campos de pouso e aeroclubes e, assim conquistar uma integração aérea nacional. O discurso da CNA fortalecia a ideia de servir a Pátria, o que poderia acontecer a qualquer momento com os conflitos mundiais da época, no caso, a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Dentre os auxílios oferecidos pela CNA, um era o mais tentador: a doação de uma aeronave para formação de pilotos civis. Assis Chateaubriand, jornalista proprietário dos Diários Associados, figura ativa na CNA, foi um grande apoiador do desenvolvimento da aviação nacional e ajudou diretamente Batatais mediando a doação do primeiro aeroplano para o Ae.C.B.
O ideário e propaganda das campanhas encontraram adeptos na juventude abastada batataense com seu espírito empreendedor. Segundo noticia ‘O Jornal’ sobre a fundação de um aeroclube na cidade: “Batatais não podia ficar à margem quando se trata, como agora, de contribuir para a Aviação Nacional (…)” (OJ, 14/03/1942). Vale registrar que, a primeira tentativa de se formar um aeroclube local ocorreu no final da década de 30, tendo como um dos seus principais incentivadores, o empresário Gabriel Jafet, co-proprietário da Fábrica de Tecidos, a Fiação e Tecelagem de Batatais juntamente com seu irmão Raphael Jafet, empresários do ramo têxtil na capital paulista.
Em 1942, após a organização efetiva do Ae.C.B., sua diretoria passou a buscar uma área para construção de uma aeropista e demais instalações necessárias para o seu pleno funcionamento. Inicialmente foram cogitados os seguintes terrenos para receber as futuras dependências do Ae.C.B.: “os de Manoel Medeiros e Plínio Coelho, o de D. Maria do Prado Baptista, o de José Testa e outros, e do terreno onde se acha localizado o antigo campo de pouso da cidade”. (ATA DE REUNIÃO DA Ae.C.B., 31/05/1942)
Com base na análise feita pelos técnicos do Departamento da Aeronáutica da Secretaria de Viação e Obras Públicas do Estado ficou decidido pela diretoria do Ae.C.B. que o Campo do Riachuelo existente nas imediações da cidade desde a década de 30, não era o local ideal para implantação da entidade aviatória. Os técnicos aprovaram um área “perto da ponte sobre o córrego do Retiro…” (OJ, 24/09/1942), “… à margem direita da estrada de automóveis e à esquerda do ‘corredor’ que leva a Nuporanga e Orlândia” (OJ, 09/07/1942).
O fato é que o Aeroclube de Batatais esteve primeiramente instalado próximo ao local conhecido como Baixada do Retiro, fora dos limites urbanos, nas proximidades da atual rodovia vicinal Virgílio Scavazza, após a passagem do Córrego do Retiro.
Pelas referências encontradas, o Ae.C.B., durante o primeiro ano de sua existência, conseguiu adquirir rapidamente a propriedade das terras que ocupava, parte por meio de doação dos terrenos e outra parte por meio de compra de alguns trechos. Os sócios-fundadores, a maioria empresários e fazendeiros da cidade e região, apoiaram o nascente aeroclube com generosas doações em terras, dinheiro e gêneros.
A maior parte das terras ocupadas pelo Ae.C.B. foram doadas à entidade aerodesportiva pelo sr. José Testa. A aquisição de outros trechos foi feita por meio de compra e para isso contou com doações, como a feita por Augusta de Figueiredo Borges, viúva do cap. Alcebíades Borges. A respectiva doação serviu para aquisição de 5 alqueires de Orestino (?) Garcia e sua mulher com a finalidade de compor a pista de pouso e adjacências. Conforme relatório publicado pela diretoria do clube, a doação foi “destinada ao pagamento de uma parte das terras onde está o campo de pouso” (OJ, 11/11/1943).
No final do ano de 1943, com apenas um ano de existência, a entidade tinha a propriedade de cerca de 20 alqueires de terras – de acordo com o sr. Artur Lopes – e contava uma razoável estrutura: “… terrenos, pista, hangar, avião, eletricidade, linha telefônica e benfeitorias outras” (OJ, 14/03/1943). Todo esse investimento demonstra o quanto as pretensões dos entusiastas da aviação em Batatais eram ambiciosas.
Ainda no mesmo ano, a diretoria e seus associados desejaram construir um parque de recreação campestre para seus associados, em área adjacente ao aeródromo. Seus sócios torciam ainda para que terras próximas ao futuro clube de recreação fossem escolhidas pelo Estado para ser o Horto Florestal a ser criado na cidade.
Segundo consta, logo após a decisão da Ae.C.B. pela construção do parque de lazer, o Estado enviou um técnico: “para fazer os estudos necessários à instalação no Parque do Aeroclube de Batatais, (…), o sr. Sylvio Porto, da Secretaria de Agricultura” (OJ, 14/03/1943) e materiais: “… já foram despachados para cá um trator, 15 tambores de óleo crú e um técnico especializado para dar início a arborização do Parque” (OJ, 25/02/1943).
O idealizado clube campestre do Ae.C.B recebeu o nome do engenheiro agrônomo e batataense, Dr. Paulo de Lima Corrêa, à época Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo e grande propulsor da aviação em Batatais. O Dr. Paulo recebeu também o título de sócio benemérito do aeroclube. Para marcar o lançamento da pedra fundamental do parque campestre, a diretoria providenciou um “marco de granito com uma placa de bronze, comemorativos da data, em que se dará ao Parque, a ser ali construído, o nome do eminente batataense” (OJ, 27/06/1943).
A pedra inaugural do parque foi lançada no dia 29 de junho de 1943 com a presença do homenageado e diversas autoridades. A placa comemorativa encontra-se no ‘Memorial Cayapó’, organizado pelo advogado e memorialista batataense, Dr. Jesus Machado Tambellini – 1º presidente do Aeroclube local. (O espaço está fechado para visitação desde o falecimento de seu organizador em 2014).
Após dois meses do lançamento da pedra inaugural do Parque e o início de suas obras, morre o grande incentivador da aviação batataense, Dr. Paulo de Lima Corrêa. Com a morte precoce do então Secretário da Agricultura do Estado de São Paulo, as obras do futuro parque foram suspensas.
LEVANTANDO VOO
O acontecimento que coroou para os amantes da aviação local o pleno funcionamento do Ae.C.B. foi o início das atividades da Escola de Pilotagem: “A Escola de Pilotagem de Batatais teve início no dia 08 de dezembro de 1942 quando da chegada em nosso aeroporto, do avião ‘Urbano Santos’ (OJ, 11/11/1943).
O piper PP-TRD foi doado em 1942 ao Ae.C.B., graças a CNA, pela colônia sírio-libanesa do Estado do Maranhão e recebeu o nome do aviador Urbano dos Santos. A cerimônia de doação foi marcada, como era costume, por um batizado da aeronave, ocorrido no antigo Aeródromo do Calabouço e depois renomeado de Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. O avião-escola foi apadrinhado em 23 de outubro de 1942, pelo casal maranhense Jayme Fernandes Guedes – chefe do Departamento Nacional de Café – e sua esposa, Helena Gurgel Guedes (OJ, 05/11/1942).
Estiveram presentes no evento, representantes do Ministério da Aviação; da elite maranhense e da família do aviador Urbano Santos, homenageado com nome no aeroplano, tendo discursado na cerimônia o próprio Assis Chateaubriand. No ato do batizado, o Urbano Santos recebeu um banho de óleo de babaçu, abundante no Estado do Maranhão, de onde partiu a doação da aeronave e seus padrinhos. Após alguns dias, em 12 de novembro de 1942, a Diretoria do Ae.C.B. ofereceu aos padrinhos, autoridades civis, da Aeronáutica e outros convidados presentes na cerimônia de batizado, um chá dançante, no Rio de Janeiro Country Clube. (OJ, 26/11//1942)
Com a chegada da aeronave em Batatais e o início dos treinamentos, entre dezembro de 1942 e janeiro de 1943, os primeiros pilotos da Escola de Pilotagem a fazerem voos individuais no Ae.C.B. foram Otto Mello, José Teixeira de Andrade, Ézio Girardi e José Yara. Alguns alunos da Escola de Pilotagem já possuíam significativas horas de voo, como o fazendeiro de Brodowski, Altino Salviano de Paulo e o batataense Carlos Junqueira Nogueira. No decorrer do ano, a Escola de Pilotagem agregou outros alunos, como: Sebastião Martins de Macedo, Cássio Alberto Lima, José Mello Silva, Geraldo Alberto Borges de Oliveira, Jesus de Mello (Dédu), Durval Costa, Manir Antônio Calil, Geraldo Malachias Marques entre tantos outros.
A primeira turma de alunos da Escola de Pilotagem do Ae.C.B. tinha por volta de 15 alunos, sendo três mulheres matriculadas, as alunas Olga de Mello Silva, Carmem Sylvia Lima e Yollanda Tambellini.
Para ser aluno da Escola de Pilotagem, o aspirante a piloto pagava por cada aula, mas, tinha ainda que preencher alguns pré-requisitos como ser brasileiro ou naturalizado brasileiro; ter acima de 17 anos – os menores de 21 anos com autorização por escrita dos pais -; ser sócio em dia com as mensalidades do aeroclube; apresentar ficha médica e fotografia.
Após a autorização para realizar sessões de voos individuais no Urbaninho, como carinhosamente passou a ser chamado a 1º aeronave do clube, acontecia o conhecido ‘batismo’ de cada piloto que assim ganhava um banho de óleo queimado, areia e grama da pista.
Os novos pilotos costumavam comemorar com chopps; salgados como coxinhas, empadas, pastéis, batatinhas, azeitonas, pururuca; doces; charutos e algumas vezes até champagne. A comemoração dos voos solos dos pilotos eram chamadas de Rosadadas por serem celebradas, na maioria das vezes, na Confeitaria Rosada, de propriedade de João Rosada e sua esposa, Ambrosina.
As aulas de voo eram intensas, começavam cedo, às 06hs e terminavam às 19hs. Para facilitar o acesso ao aerocampo, distante uns 5 km da cidade, no início a Empresa Bologna de Transportes fazia o traslado de coletivo “movido a gasogênio”, 3 vezes ao dia, ao custo de Cr$2,00 por passageiro”. (OJ, 14/03/1943); mas com o tempo, deixou de fazê-lo e, assim, o acesso ao aeroclube tornou-se a maior dificuldade apontada pelos usuários aliado as péssimas condições das estradas.
A questão do transporte coletivo e da estrada que levavam até o Aeroclube foram temas debatidos de forma contínua entre o Ae.C.B., a municipalidade e o governo estadual durante o período pesquisado; a todo momento indicam as péssimas condições de conservação do trecho e com isso, a dificuldade de acesso ao clube.
O 1º instrutor de voo nomeado do Ae.C.B. foi Erick Almeida, mas este não chegou a trabalhar efetivamente; sendo então nomeado o jovem paulistano José Monteiro Aguiar, que foi instrutor entre janeiro de 1943 e abril de 1943; em seguida, por cerca de um ano foi instrutor o paulistano Arildo Suplicy de Figueiredo; nos anos de 1945 e 1946 foi instrutor Antônio Fernandes Videira; no período de licença saúde do sr. Antônio Videira, entre abril e outubro de 1946, foi instrutor do aeroclube local, o sr. Arildo Suplicy.
Ao que tudo indica Antônio Videira foi instrutor de voo até o início dos anos 50; em seguida encontramos novamente o nome do sr. Arildo Suplicy e no início de 1952, outro instrutor de voo, o mineiro Remo Rocco. Depois da saída de Rocco, o que se tem é um revezamento dos antigos instrutores de voo que haviam trabalhado no Ae.C.B na década anterior, os senhores José Monteiro Aguiar e Arildo Suplicy.
Com apenas 3 meses de funcionamento, a Escola de Pilotagem conseguiu brevetar a primeira turma de alunos, avaliados pela Banca Examinadora do Departamento de Aeronáutica Civil da 4ª zona aérea de São Paulo. Posteriormente, paraninfaram a turma dos novatos aviadores batataenses, o interventor federal, Dr. Fernando Costa e Dona Helena Gurgel Guedes – madrinha do 1º aeroplano, o Urbano Santos. Nesta época, os novos pilotos civis ingressavam automaticamente na reserva da recente orça Aérea Brasileira.
PRESIDENTES DO AEROCLUBE DE BATATAIS – 1942/1954
Dr. Jesus Machado Tambellini – 1942
Benedicto Marques de Souza – 1943 e 1944
Dr. Luís Cândido Alves – 1945 a 1950
Dr. Manoel Alves Pereira – 1951 a 1956
1ª Diretoria do Aeroclube de Batatais
1942 – 1943 – José Arantes Junqueira, presidente honorário; dr. Jesus Machado Tambellini, presidente; Joaquim Barbosa Junior, vice-presidente; Nestor Villar de Figueiredo, tesoureiro; dr. Luís Cândido Alves, 2º tesoureiro; Carlos Figueiredo Jr., secretário; Jesus Brasílio Tambellini, 2º secretário; Anselmo Testa, diretor geral; Durval Costa, Justino de Moraes e Pedro Garbellini, Comissão Técnica de Aeronáutica; suplentes – Paulo Pereira de Mello, Benedicto Marques e Tercio Lellis; Antonio Abeid, José Teixeira de Andrade e Archimedes Scatena, Conselho Consultivo e de Contas; suplentes – Dr. Antônio Nogueira, João Cândido Alves Filho e Manir Antônio Calil. (OJ, 14/05/1942) Zelador de Campo: Alacrino Marques Pereira
Relação nominal de alunos matriculados no Ae.C.B.
08/12/1942 a 29/02/1946
As informações e dados aqui reunidos foram retirados do O Jornal pertencente ao acervo documental do Museu Histórico e Pedagógico ‘Dr. Washington Luís’ e dos primeiros livros de atas de reuniõe do Aeroclube de Batatais (1942-1956). Contribuíram ainda para esta pesquisa, a entrevista de Carmem Sylvia Lellis Lima dada a Clotilde M. Cardoso, publicada na Revista Amicus (maio/2005), além dos depoimentos do Comandante’ Artur dos Santos Lopes, Luis Roberto Squarisi e Carolina Mello. Agradecemos a atual diretoria do Ae.C.B., em nome de seu secretário Eduardo Guerreiro, da família do sr. Rui Teles pela gentileza em nos atender.