O entrevistado dessa semana é o Tenente da Polícia Militar em Batatais, Lucas Sançana de Melo. Com 29 anos, o atual subcomandante de Companhia da PM em nosso município, é Bacharel em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco, Bacharel em Direito pela Universidade Cruzeiro do Sul, Bacharel em Administração de Empresas pelo Centro Universitário Claretiano e Pós-Graduado em Ciências Sociais pela Universidade Cidade de São Paulo. Professor de Direito Penal, Procedimentos Operacionais e Gestão pela Qualidade na Supervisão nas Escolas de formação e especialização da Polícia Militar nos municípios de São Paulo e Franca. Lucas ingressou na Polícia Militar em 2009, aos 19 anos de idade, tendo servido na Capital Paulista por aproximadamente 7 anos, entre o tempo de escola e serviço operacional. Ao retornar para o interior, trabalhou no Comando de Força Patrulha em Franca. Em 2017 foi designado para uma nova missão, comandar por um ano a cidade de Igarapava e em 2018, já buscando estar mais perto de sua cidade natal, comandou o Pelotão da Polícia Militar no município de Morro Agudo. No fim de 2018, quase 10 anos após ter ingressado na corporação, retornou à sua cidade, Batatais, onde responde como subcomandante de Cia, tendo além de Batatais, outras 4 cidades sob sua supervisão: Patrocínio Paulista, Restinga, Itirapuã e São José da Bela Vista.
JC – Tenente Lucas, agradecemos a disposição em participar da entrevista para o Jornal da Cidade. Para iniciar gostaríamos de sua avaliação sobre a atual situação da ‘Segurança Pública’ dentro do Município de Batatais.
Tenente Lucas Sançana: Batatais, graças ao empenho dos policiais, que se desdobram para superar as adversidades, tem hoje uma situação controlada no que diz respeito aos índices criminais. O crime que infelizmente sofreu um aumento, comparado com o ano de 2018 foi o homicídio, no total de 6, número elevado para uma cidade acostumada à tranquilidade. Porém, apesar de também envidarmos esforços no combate a esse crime, muitas ações fogem à alçada da Polícia Militar. Crimes passionais dificilmente são combatidos com ostensividade e ação de presença, é necessário uma somatória de forças para minimizar seu cometimento, mantendo as áreas da cidade bem cuidadas, oferecendo ajuda através do assistencialismo social às pessoas em situação de vulnerabilidade e etc. e tudo isso passou a ser feito, hoje temos operações integradas entre Polícia Militar, Guarda Municipal, Psicólogas e Assistentes Sociais do Município visando exatamente auxiliar essas pessoas, o que já gerou um resultado expressivo, visto que no segundo semestre os números diminuíram significativamente. Outro crime que se destaca é o Tráfico de Drogas, e isso é triste. Cada vez mais vemos nossos jovens se enveredando por esse caminho, famílias sendo destruídas, crianças sendo escravizadas, por isso não baixamos a guarda, até a data desta reportagem, já foram 91 flagrantes deste crime, sem contar os atos-infracionais, ou seja, as ocorrências nas quais menores de idade são surpreendidos na prática deste ilícito.
JC – A cidade vem crescendo com novos loteamentos e em número de habitantes, hoje são 62.508, segundo projeção do IBGE 2019. Como é para o comando da Polícia Militar manter as atividades e a segurança com praticamente o mesmo efetivo de 20 anos?
Tenente Lucas Sançana: Difícil, na verdade nosso efetivo hoje é menor do que a 20 anos atrás e isso não é uma característica exclusiva de Batatais, mas sim do Estado todo. Muitas vezes nos cobram celeridade no atendimento ou presença em diversos locais, mas estamos administrando uma situação complicada, com poucos policiais e uma demanda cada vez maior. Para contornar essa adversidade; que repito não é exclusividade de Batatais, mas sim do Estado todo que sofre com a precariedade do funcionalismo público; nós buscamos alternativas inteligentes de policiamento, como por exemplo o Projeto Vizinhança Solidária, no qual, em parceria com o Conselho de Segurança, criamos nos bairros grupos de WhatsApp e estimulamos nos moradores o sentimento de “pertencimento social”, para que informem às forças policiais o mais rápido possível qualquer situação que considerarem de risco à segurança, ou seja, pedimos ajuda à população para que olhem uns pelos outros e nos acionem sempre que precisarem. Importante destacarmos que a Polícia Militar faz parte de uma engrenagem, nós somos uma catraca que auxilia o bom funcionamento do todo, porém, para que a sensação de segurança seja eficaz, é necessário que todas as peças girem em conformidade: Judiciário, Ministério Público, Polícia Civil, Guarda Municipal e o mais importante de todos, a própria sociedade, que também tem a responsabilidade constitucional prevista no art. 144 de zelar para que tenhamos um ambiente saudável e seguro para vivermos em paz. O fato de conseguirmos controlar os indicadores criminais, revela esse comprometimento coletivo, da mesma forma, quando algo vai mal, os responsáveis somos todos nós, cada um dentro do que lhe compete.
JC – Qual o esquema de policiamento para a região central agora em dezembro, com o comércio abrindo no período noturno?
Tenente Lucas Sançana: O que podemos dizer, sem muitos detalhes para evitar que os criminosos se articulem, é que assim como fizemos na Festa Do Leite (a mais segura de todos os tempos com relação a estatística de crimes ocorridos), iremos nos desdobrar para garantir que a população de bem e os comerciantes tenham tranquilidade para gerir suas vidas. Esse ano temos uma grande novidade com relação ao ano passado, o Policiamento com Motocicletas, que estarão intensificando suas ações durante a permanência do comércio aberto. Ainda, nesse período, as escalas das nossas equipes de apoio, ou equipes intermediárias, serão ajustadas para que os policiais consigam manter a ostensividade e prevenção nos horários de maior incidência do cometimento de crimes, bem como nos locais de maior concentração de pessoas.
JC – Divulgamos recentemente que Batatais seria contemplada com uma viatura tipo ‘Unidade Móvel’ para a Polícia Militar. O veículo está na cidade, como pudemos constatar. Já tem previsão para colocá-la em atividade?
Tenente Lucas Sançana: A viatura está sim à disposição, o que ocorre, e isso novamente não é exclusividade de Batatais, é que o veículo, diferente dos anteriores, veio com 13 lugares, o que torna necessário que o condutor seja habilitado na categoria “D”. Em Batatais, apenas um policial possui essa habilitação e ele não faz parte do quadro operacional. Diante disto, estamos ajustando para que o mais rápido possível tenhamos policiais habilitados e possamos, enfim, utilizar a Base Móvel em alguns eventos específicos.
JC – Um trabalho realizado pela Polícia e o Sindicato Rural, com uma melhor identificação das propriedades rurais, vem recebendo elogios. Como foi idealizada essa ação?
Tenente Lucas Sançana: Nós tínhamos uma grande dificuldade para atendimento de ocorrências nessas áreas. Cada morador nos dava como referências para deslocamento, características de suas propriedades que para eles eram comuns, mas para meus policiais de difícil entendimento, por exemplo: árvores, cana, cerca e etc. Hoje, nós conseguimos, junto com o Sindicato Rural e o Veterano da Polícia Militar Sargento Jorge Pupim, membro do Conselho de Segurança, mapear diversas propriedades e cadastrá-las em um banco de dados para funcionamento offline. Desta forma, quando a viatura é acionada para atendimento na área rural, não precisa mais das referências do local para conseguir chegar, basta apenas digitar o endereço eletrônico da propriedade cadastrada e o mapa é traçado para navegação offline através de um aplicativo de celular. Com isso, reduzimos consideravelmente o tempo de resposta do nosso atendimento, que se tornou muito mais eficiente, afastando os criminosos da área rural da nossa cidade.
JC – Um problema que persiste ao longo dos anos, não só em Batatais, é a questão da perturbação do sossego. Qual a orientação da Polícia Militar nesses casos?
Tenente Lucas Sançana: Primeiro, deixar claro que a Polícia não deve ser acionada para “dar susto no vizinho”, mas sim para resolver um problema. Muitas vezes nos ligam e não demonstram claramente que querem por fim àquela situação, nos pedem apenas para “assustar” quem estiver perturbando. Essa é uma ocorrência complicada, os Agentes do Estado, ao detectarem o som alto, podem agir de ofício, sem a presença de nenhum solicitante. Ocorre, porém, que essa atuação não tem força jurídica e o problema é resolvido num primeiro momento, mas retorna novamente e gera desgaste de ambas as partes. O ideal é que os vizinhos que se sentem perturbados tentem num primeiro momento dialogar, estabelecer parâmetros para que o problema se resolva sem a interferência de terceiros. Caso isso não seja possível, fica aqui minha sugestão para que se articulem, reúnam um número razoável de vizinhos insatisfeitos e registrem uma ocorrência nesse sentido ou até mesmo protocolem diretamente no Ministério Público essa insatisfação. Dessa forma, o perturbador será orientado em caráter de obrigatoriedade a cumprir o que for determinado e caso descumpra, aí sim, dará subsídios para que a Polícia Militar atue com a firmeza necessária para acabar com o problema. Caso contrário, estaremos sempre tratando com novalgina um paciente com doença grave, controlando a febre, porém sem a verdadeira cura.
JC – O Presidente Jair Bolsonaro enviou ao Congresso um Projeto de Lei para isentar de punição militares e policiais envolvidos em operações de ‘Garantia da Lei e da Ordem’. Qual sua avaliação sobre a medida?
Tenente Lucas Sançana: Na minha opinião, não muda quase nada. O projeto apenas tira a subjetividade na interpretação do que é “legítima defesa”, especificando o que se entende por “injusta agressão”. Para nós, militares estaduais, de fato não há, ao meu ver, nenhuma implicância, tendo em vista que as GLO (Operações Garantia da Lei e da Ordem) são em regra realizadas pelas Forças Armadas. Apenas para esclarecer para o leitor, sempre que há uma situação de perturbação da ordem que as forças tradicionais de segurança (como as polícias estaduais) não conseguem resolver, é conferido às Forças Armadas o direito de atuar com o poder de polícia em uma determinada região por um período específico, nas então chamadas Operações de Garantia da Lei e da Ordem.
JC – Já por vários anos comenta-se sobre a necessidade da implantação de câmeras de monitoramento nas entradas da cidade e também em outros lugares estratégicos. Até agora a proposta ficou no campo das ideias. Para a Polícia Militar quanto esse ‘monitoramento’ ajudaria?
Tenente Lucas Sançana: Ajudaria bastante. É um projeto importante e que em todas as cidades por onde passei e conseguimos sua implantação, surtiu efeito positivo. O criminoso quer facilidade, quer valer-se do anonimato e da chance de não ser descoberto. A partir do momento que sabe que, mesmo não tendo a presença de uma viatura naquele local, ele pode estar sendo filmado e essas filmagens servirão para identificá-lo, com certeza não o fará em Batatais. Precisa-se, porém, que o projeto seja estruturado de maneira simples, definindo primeiramente quem seria responsável por esse monitoramento (vez que a Polícia Militar, como já dito, não tem efetivo disponível para mais essa demanda e a Polícia Civil atua na repressão mediata e investigação, ou seja, não compreende também em seu rol de missões esse monitoramento). Após isso, partiríamos para a aquisição das câmeras e instalação em locais estratégicos. Ainda que sem monitoramento constante, a instalação das câmeras continua sendo uma boa ideia, pois auxiliaria a Polícia Civil nas investigações e inibiria num sistema de contrainformação as ações delituosas.
JC – Tenente, a população acaba muitas vezes sendo um braço importante para auxiliar a Polícia Militar. No caso com o acionamento, com denúncias e informações, a orientação é sempre ligar 190?
Tenente Lucas Sançana: 190 é a via mais rápida. Temos um controlador 24 horas por dia para filtrar as ocorrências que caem, bem como as informações recebidas e empenhar as viaturas no atendimento de acordo com a gravidade, relevância e também nossas condições. Também temos o telefone 181 que é o nosso Disk-Denúncia. Tudo que nos é relatado por esse canal é repassado aos policiais e apurado. Além disso, temos hoje os grupos de WhatsApp do Programa Vizinhança Solidária, por lá também várias informações são fornecidas, porém, é sempre importante frisar: toda emergência deve ser transmitida via 190.
JC – Outro trabalho de destaque da PM é o Proerd, programa de prevenção às drogas levado as escolas. Atualmente quantos alunos são envolvidos e quem está na condução das atividades?
Tenente Lucas Sançana: Somente esse ano, 730 alunos foram atendidos pelo Programa, em 12 escolas (municipais, estaduais e também particulares). Ministrando as aulas, temos hoje o Cabo PM Márcio Silva, que num total, desde que iniciou sua trajetória nessa missão, já formou no Programa mais de 7.000 alunos.
JC – Gostaria de seu comentário sobre os temas a seguir:
– Soltar bandido condenado em segunda instância: Essa é uma resposta totalmente pessoal e não expressa o pensamento Institucional. Eu considero um desrespeito com o próprio judiciário. A decisão monocrática impetrada por um juiz e ratificada posteriormente por desembargadores num colegiado em 2ª instância deveriam ser respeitadas. Sou apaixonado pelo Direito, e me entristece ver a quantidade de remédios constitucionais e recursos que temos para protelar e ganhar tempo com ares de malandragem que nos rotulam até mesmo fora do país, com o famoso e vergonhoso “jeitinho brasileiro”. Se nossa justiça fosse célere, tudo bem, mas infelizmente não é, e não por culpa dos nossos magistrados. Existem processos que levam anos para serem julgados e agora, sendo necessária a apreciação em mais uma instância (isso aos que tiverem condições de pagar um advogado para entrar com os recursos), veremos a impunidade aumentar. Mais uma vez, nossa legislação revela que o crime no Brasil não acontece por falta de oportunidade, por falta de condições, já que muitos que vivem na dificuldade conseguem superá-la e tornam-se vencedores, o crime aqui na verdade acontece pois, diante da impunidade, compensa.
– As novas regras de aposentadoria para os Militares: Como principal mudança, tivemos o aumento de contribuição de 30 para 35 anos, em contrapartida, conseguimos manter a paridade e integralidade que vinham sendo ameaçadas. Estamos pagando um preço pelas garantias que julgamos fundamentais, e assim como outros segmentos estarmos dando nossa cota de sacrifício. É importante a oportunidade de esclarecer à nossa população que a profissão militar tem características próprias com relação aos direitos trabalhistas, como por exemplo: os militares não fazem jus a remuneração do trabalho noturno superior ao do trabalho diurno; estão disponíveis 24 horas por dia — dedicação exclusiva — isto é, trabalham muito mais que a média dos trabalhadores da iniciativa privada e servidores civis; não têm direito a repouso semanal remunerado; não têm direito ao adicional de periculosidade e hora extra; os militares não recolhem o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS); os militares não podem participar de atividades políticas e os militares não podem se sindicalizar.
– Porte de arma para o cidadão comum: também vou expressar aqui minha opinião pessoal. Desde o começo da reportagem estou respondendo sobre questionamentos relacionados às nossas dificuldades: efetivo, material, leis fracas que estimulam o crime e etc. Diante deste cenário, não tendo eu, como agente do Estado, condições de garantir à toda população a segurança que eu gostaria de poder proporcionar, me sinto sem condições morais de impedir que se defendam. Não acho justo, não tendo condições de zelar por todas as casas e todas as famílias, tirar esse direito de alguém que trabalha, que luta para conquistar seu patrimônio, tirar o direito de um pai de família de defender sua filha ou esposa que estiverem sendo vítimas de um crime. Eu queria que nem mesmo a Polícia precisasse andar armada, esse seria o lugar ideal para vivermos, mas infelizmente estamos distantes dessa realidade e, sendo assim, já que o estatuto do desarmamento claramente não funcionou, visto que somente as pessoas honestas devolveram suas armas e os bandidos continuaram se armando cada vez mais, que possamos devolver esse direito, não ao “cidadão comum”, mas sim ao cidadão que se mostrar preparado, que demonstrar reunir condições técnicas e morais para portar uma arma de fogo, sendo submetido a exames criteriosos para comprovar tal aptidão. Ao meu ver, a única forme de garantir o enfrentamento de um homem mau com uma arma na mão é tendo um homem de bem, também nas mesmas condições, caso contrário, estaríamos favorecendo um dos lados.
– Parceria com a Guarda Municipal: como foi dito, a Polícia Militar é apenas uma peça dentro de uma grande engrenagem que, para ter seu pleno funcionamento precisa da união e integração de todos. A Guarda cumpre muito bem o seu papel, zela pelas instalações do município e nos apoiam quando a necessidade se faz urgente dentro de alguma ocorrência.
– Atuação do CONSEG – Conselho Comunitário de Segurança em Batatais: O Conselho de Batatais faz um ótimo trabalho. São parceiros sempre dispostos a atender as demandas relacionadas à segurança pública. Aproveito aqui para convidar à população a prestigiar as reuniões do CONSEG que ocorrem mensalmente. Precisamos ouvir o povo, queremos saber quais são os anseios da nossa comunidade e lá, temos um bom canal para fazer fluir essa comunicação.
JC – Agradecemos sua participação e deixamos o espaço aberto para suas considerações finais.
Tenente Lucas Sançana: Quero aqui agradecer o espaço e dizer à toda população que o nosso Quartel estará sempre de portas abertas. A Polícia Militar quer fazer parte da vida do batataense, levando segurança às famílias e servindo de referência para nossas futuras gerações. Sob a égide de que a “educação é a melhor arma que podemos usar o mundo” (Mahatma Gandhi), estou empenhado, desde o dia em que aceitei o desafio de trabalhar em Batatais, a buscar junto a meus policiais elevar nosso patamar de atuação, reafirmando nossa intenção de ter a cada dia que passa um profissional que se evidencie pela sua educação, profissionalismo e técnica, levando segurança à população e combatendo o crime com firmeza, eficiência e legalidade.