Alguns questionamentos surgiram desde o final de semana passado à respeito da necessidade real do lockdown decretado pelo Prefeito Juninho Gaspar em Batatais. Vamos tentar elucidar alguns pontos desta questão, deixando claro que essa discussão poderia tomar muito mais tempo, mas tempo, numa pandemia como essa, pode significar perda de vidas.
A Lei Federal da pandemia (13.779/2020), estabelece a legitimação para o poder executivo, seja municipal, estadual ou federal para a decretação de regime de “lockdown” (ou “confinamento total”), sempre lastreado em dados estatísticos e análise de impacto da evolução da pandemia em determinada localidade. A referida Lei, que reconheceu a situação de emergência na saúde pública em todo país, também estabeleceu critérios para a adoção de medidas como quarentena, isolamento e restrição de locomoção. Essa situação de emergência, pode autorizar a adoção de medidas adequadas e necessárias para conter o espalhamento da doença e colapso das redes pública e privada de saúde, inclusive com restrições justificadas ao direito de ir e vir, como no caso do lockdown.
Diz ainda a nossa legislação, que trata-se o regime de lockdown de uma medida excepcional que só é aceitável em uma situação de grave crise sanitária em que os indicadores hospitalares e a transmissão viral indiquem que é imprescindível a diminuição da circulação de pessoas para diminuir o número de contágio e desafogar o sistema de saúde. Para sua implementação, também é preciso que o município, Estado ou o país, estejam em estado de calamidade pública. Sem esses elementos, o lockdown não deve ser adotado.
Vários fatores devem ser considerados pelos gestores da saúde para a determinação de lockdown em determinada localidade, tais como:
– já terem sido adotadas medidas restritivas na localidade, sem que estas surtissem efeito, ou seja, a contaminação continua em alta;
– aumento expressivo do número de casos positivos, pela média semanal ou quinzenal;
– aumento do número de pessoas em isolamento e tratando a doença, pela média semanal ou quinzenal;
– aumento no número de mortes (número de casos/mês);
– percentual ocupação dos leitos de UTI, e enfermaria Covid-19 no âmbito da localidade afetada (evolução semanal).
Na semana passada, Batatais apresentava alta considerável em TODOS OS ÍNCIDES ACIMA RELACIONADOS, o que caracterizava claramente um descontrole na propagação do coronavírus em nosso município, além do surgimento de uma “fila de espera” por leitos de UTI.
Com a constatação deste cenário, diante da análise objetiva dos dados coletados, e com a projeção de que o cenário iria piorar (como efetivamente ocorreu nessa semana), o prefeito municipal, de forma prudente, consciente, correta, e principalmente, URGÊNTE, decretou a medida necessária para conter a circulação do vírus em nossa cidade.
Um exemplo muito esclarecedor é com relação à evolução no número de casos positivos, e óbitos nas 3 últimas quinzenas:
– 1ª quinzena abril: 265 casos /7 óbitos
– 2ª quinzena abril: 550 casos/13 óbitos
– 1ª quinzena maio: 806 casos/16 óbitos
Terça e quinta-feira desta semana, rompemos a marca de 100 casos por dia, projetando mais de 1800 casos somente em maio, mês que já conta com o número recorde de 29 óbitos (até 20/05, data que escrevo este artigo).
Também foram considerados outros fatores diretamente relacionados com o controle da disseminação da doença, como a lentidão na distribuição das vacinas disponíveis pelo Plano Nacional de Imunização, a falta de insumos indispensáveis para o tratamento da doença na rede pública e privada de saúde, em especial do chamado kit intubação (bloqueadores neuromusculares, hipnóticos e analgésicos) e oxigênio, o limite da capacidade de expansão de leitos e de suporte de profissionais especializados de saúde, a fila de espera por leitos de UTI em nossa UPA, a circulação comprovada pela pesquisa do Instituto “Adolfo Lutz”, finalizada no final de abril p.p., que constatou a predominância de circulação da variante P.1. do coronavírus em nossa região (variante mais agressiva e transmissível), na proporção de 9 para cada 10 casos, e, é claro, a falta de conscientização da população em praticar o distanciamento social, evitando aglomerações desnecessárias.
Em vista do nosso cenário atual, considero que o prefeito acertou ao tomar a medida, que aliás começa a ser seguida por outros prefeitos da região, que vão endurecendo as medidas de isolamento em suas cidades, ante o avanço deste implacável vírus.
Sim, teremos mais reflexos econômicos com certeza, mas nesse momento, a maior responsabilidade do gestor de saúde é lutar para que o sistema de saúde pública continue tendo possibilidade de atender a todos, e a salvar vidas, sob pena de ser responsabilizado administrativa, civil e criminalmente. Façamos nossa parte, cumprindo à risca as medidas do lockdown nestes 16 dias, e os bons resultados com certeza aparecerão.