Nesta edição de novembro, voltamos a falar dos construtores, dando o merecido destaque a um batataense que se tornou famoso em todo o país jogando futebol na posição de ponta direita entre os anos de 1932 e 1941, mas que também foi responsável pelo crescimento de Batatais e acolhimento das pessoas que vinham do campo para morar na cidade, entre as décadas de 1940 a 1970.
Estamos falando de José dos Santos Lopes, mais conhecido como Zeca Lopes, que nasceu em Batatais no dia 1º de novembro de 1910 (sendo registrado apenas no dia 25 de fevereiro de 1911) e que desde muito criança já ajudava seu pai, Arthur Lopes de Oliveira, como servente de pedreiro e posteriormente como pedreiro na construção civil.
Zeca Lopes era o terceiro filho de sete irmãos e foi ao lado dos irmãos Neca, Geraldinho e Luís, que ele deu seus primeiros chutes como jogador de futebol no Riachuelo Futebol Clube. Aos 15 anos, jogava no Batatais Futebol Clube; já entre seus 16 e 17 anos, jogou no Sport Club de Uberabinha (Uberlândia) e posteriormente em clubes das cidades de Bebedouro, Jaboticabal, Rio Preto, São José do Rio Preto e Ribeirão Preto.
Também foi ao lado dos irmãos e do pai, que Zeca Lopes aprendeu a levantar paredes, cobrir telhados e construir edificações. Todavia, o talento para o empreendimento imobiliário foi algo exclusivo do jogador que, ao mesmo tempo em que fazia sucesso na carreira esportiva, construía pequenas moradias em sua terra natal.
Em 1930, começa a jogar no Comercial de Ribeirão Preto, seguindo em 1932 para o Corinthians e lá permanecendo até 1941, e como muitos já sabem, Zeca Lopes teve também uma honrosa passagem em 1938 pela Seleção Brasileira.
De acordo com o encarte comemorativo do Centenário de Zeca Lopes (1910-2010), Lopes “Foi o predecessor, por assim dizer das casas populares, pois construía moradias simples e as vendia em suaves prestações.”
O primeiro registro de venda de uma escritura em nome de José dos Santos Lopes data de 13 de dezembro de 1933, quando jogava no Corinthians, sendo um terreno na Praça Riachuelo nº5, vendido para Maria Virgilina Lopes Oliveira.
Aos 25 anos de idade, no dia 27 de fevereiro de 1935, Zeca Lopes se casou com a jovem de 16 anos, Isabel Parpinelli (19/01/1919 – 21/07/2002), conhecida como Helena, com quem foi casado por 61 anos e teve quatro filhos: Benedicta Lopes, Arthur dos Santos Lopes, Rosa Helena Lopes e José dos Santos Lopes Filho.
Os leitores podem estar se perguntando como uma pessoa que se chamava Isabel era conhecida pelo nome de Helena? Pois esta história é mais uma das tantas que aconteciam em nossa cidade por ocasião do registro no Cartório dos nomes das crianças recém nascidas. De acordo com Benedita e Rosa (filhas do casal), quando a mãe nasceu, era desejo de sua avó que o nome fosse Helena, mas chegando ao Cartório o avô disse que o nome escolhido era Isabel. Voltando para a casa, o avô confirmou que o nome era o que a esposa havia escolhido, mas como a mesma era analfabeta, não foi possível verificar que na certidão estava escrito Isabel. Muitos anos se passaram e a criança sempre chamada de Helena só foi descobrir seu nome de registro quando apresentaram seus documentos para a matrícula na escola.
Voltando ao empreiteiro, mesmo tendo conhecimento sobre edificações e tino para negócio, foi somente após o trágico fim de sua carreira como jogador de futebol, com a grave contusão de seu joelho em 1941, que Zeca Lopes voltou a morar em Batatais e se dedicou de forma mais intensa ao ramo da construção, construindo e reformando casas para as pessoas mais humildes, sendo responsável pela formação de quatro grandes bairros da cidade: Riachuelo, Vila Cruzeiro, Caixa d’Água e Jardim Santa Luísa.
Os filhos de Zeca Lopes guardam com orgulho a história do pai e entre os recortes de jornais e revistas encontramos um trecho da entrevista cedida à A Gazeta Esportiva Ilustrada (s/d, p.33), em que Zeca Lopes afirma que quando abandonou a carreira de jogador voltou para Batatais com uma certa quantia em dinheiro suficiente para ele adquirir algumas casas modestas e um sítio.
O primeiro bairro em que Zeca Lopes ergueu casas foi no Riachuelo, que fazia divisa com o então denominado “Alto do Papagaio”, e foi nesta divisa que o empreiteiro construiu sua emblemática residência de dois andares, conhecida como “Prédio do Zeca Lopes”, onde atualmente reside a primogênita da família.
Na década de 50, já havia na cidade a “Vila do José Lopes” na parte alta da cidade, posteriormente conhecida como Bairro da Caixa d’Água, e que rendeu uma bela reportagem assinada pelo codinome “Laio” no O Jornal nº 75 (19/07/1953) a qual transcrevemos aqui alguns trechos:
“Estivemos terça-feira última em visita ao bairro conhecido pelo nome de Alto do Papagaio, um patrimônio tradicional de nossa gente. A ação progressista de José Lopes, incorporada ao desejo ardente de trabalhar por sua terra, está transformando a parte mais alta da cidade, até então cheia de vastos claros e esparsas casas, num verdadeiro prolongamento de nossa urbe.
(…) Na chamada vila do José Lopes, localizada privilegiadamente quer pela sua altitude, quer pelo presente que a própria natureza nos oferece, estampado em uma visão panorâmica maravilhosa de toda cidade expressa particularmente pela cúpula de nossa Igreja Matriz, fomos encontrar já um grande conjunto de casas dispostas em simetria atraente.
Conversando com o nosso amigo Zeca Lopes propugnador incansável da grandeza de Batatais, pudemos auscultar os seus pensamentos referentes aos seus planos de amiudamento da construção dessas pequenas residências naquele lado, e de tudo o que ouvimos e que nos foi dado verificar, pelos vários alicerces já montados, e de mais de 60 casas construídas e vendidas, além de outras em término ou prontas, que os seus planos ainda tendem a extender-se com mais edificações, em terrenos já iniciados em arruamentos à espera das mesmas.
(…) Quase no anonimato ele executa o seu programa, dentro da modéstia e da simplicidade que lhe são características. O propósito é só de Batatais.
Zeca Lopes! Construíste os nossos ataques destruindo as defesas estrangeiras e hoje estás construindo para a grandeza de sua terra!”
Zeca Lopes também contribuiu com o crescimento da cidade em direção ao Alto do Cruzeiro, edificando inúmeras casas na atual Vila Cruzeiro, entre as décadas de 50 e 60, às quais a família identificou algumas remanescentes gentilmente fotografadas para esta edição.
No dia 17 de abril de 1967, Zeca Lopes adquiriu da família Bertolucci a área do atual Jardim Santa Luísa, que foi dividida em 222 lotes onde aos poucos foi erguendo os sobrados, posteriormente vendidos a preços baixos e longos prazos.
Neste bairro, o nome dado foi em homenagem à sua mãe, Luíza Ferreira Borges, e à Santa Luíza de Marilac, declarada patrona das Obras Sociais em 1960, pelo Papa João Paulo XXIII, ressaltando assim mais uma importante característica de Zeca Lopes, que era a religião.
Sobre este ponto, também queremos destacar que muitas das casas construídas por Zeca Lopes possuíam logo na varanda de acesso à residência, um nicho para a colocação de um oratório, como forma de proteção, ressaltando a importância da fé em sua profissão.
No Jardim Santa Luíza, popularmente chamado de Vila Lopes, as primeiras casas foram construídas a partir de 1968, sem existir no local nenhuma infraestrutura de iluminação ou rede de água e esgoto. Somente nos anos 80 é que o bairro recebeu as melhorias na rede e nos anos 90 a pavimentação.
Tamanha era sua fé e devoção a São Benedito, que além da primeira filha ser batizada como Benedita, Zeca Lopes também chegou a doar para a paróquia um quarteirão à frente de sua residência para a construção da Igreja de São Benedito, o que acabou levando outro destino. Todavia, após verificar o registro em ata, da intenção e doação do ex-jogador, a capela do Menino Jesus de Praga, situada no bairro Riachuelo junto à praça Álvaro Cardoso, passou a ter outro santo como padroeiro da comunidade, São Benedito, a partir de 29 de abril de 2007.
Por fim, de acordo com os documentos da família, até maio de 1995, havia cerca de 413 escrituras e certidões de propriedade registradas em nome de José dos Santos Lopes, sendo 227 no Cartório de 1º Ofício e 186 no Cartório de 2º Ofício.
Zeca Lopes viveu até os 86 anos, vindo a falecer no dia 28/08/1996, mas seu legado permanece vivo através do incansável trabalho de sua família na perpetuação da memória dos pais, dando igual importância à matriarca Helena, verdadeiro esteio de toda família.
Segue abaixo, a transcrição do depoimento da filha primogênita, Benedita:
“Batataense nascido em 1º de Novembro de 1910, filho de Arthur Lopes de Oliveira e Luiza Ferreira Borges.
Família muito pobre; pois a pai era pedreiro e a mãe costureira. Criavam oito filhos, em dois cômodos de taipa nos fundos do Campo de Futebol de Batatais.
Todos os filhos desde menino ajudavam o pai na lida como servente de pedreiro e gostavam de jogar bola.
José, o terceiro dos irmãos era mais inquieto e sonhador. Jogava bola depois do trabalho e ficava procurando um jeito de ganhar algum tostão extra para ajudar em casa.
Muito cedo, destacou-se como jogador de bola e também como empreendedor. Em 1933 comprou um terreno, construiu o seu primeiro casebre e negociou.
Casou-se com Isabel Parpinelli, mais conhecida como Helena e teve quatro filhos.
Jogou nos times da redondeza e investia em terrenos, construindo e negociando.
Jogou no Corinthias e de lá foi convocado para a seleção de 1938 onde o Brasil, pela primeira vez ficou para as finais e terminou no 3º lugar.
Tudo que ganhou investiu em sua cidade.
Tinha bom coração e ajudava muitas pessoas.
Idealista e sonhador além de bom filho e esposo, procurava o bem estar de todos.
Formou os Bairros: Riachuelo, Caixa D´água, Vila Cruzeiro e Jardim Santa Luiza, que era uma gleba de terreno perto da Cachoeira, sem nenhuma infraestrutura.
Passou mais de 1mil escrituras; deu casa para muitos dos seus auxiliares.
Zeca Lopes, como era conhecido, nunca quis sair de sua querida cidade Batatais. Até hoje ele é lembrado como homem caridoso que gostava de agradar a todos. Foi um homem temente a Deus, bom esposo e pai amoroso, cidadão exemplar.
Todas essas virtudes do Zeca Lopes se deve ao estímulo de sua esposa helena, que o apoiava; e vivia com ele na glória e nas dificuldades.
Helena era para ele “sua segunda mãe!”
Helena foi o alicerce responsável pela família que formamos.”