O QUE FOI NOTÍCIA NA GAZETA DE BATATAIS
Prezados leitores e leitoras, demos uma pausa na série Monumentos: bustos, esculturas e painéis para apresentarmos o nosso Há 100 anos, que no decorrer de 2023 ficou esquecido em meio a tantos bustos e esculturas pesquisadas em nossa cidade; isso sem contar os painéis que nem foram apresentados aos leitores ainda.
Utilizamos como fonte documental sobre o que foi notícia há 100 anos, o jornal que circulava pela cidade, a GAZETA DE BATATAES, que no ano de 1923 comemorava 15 anos de sua existência. Era diretor-principal Jesus Basílio Tambellini e diretor-gerente, Joaquim Morais e suas oficinas tipográficas ficavam na Rua Marechal Deodoro, nº 21. Se, no período tratado, existiram outros semanários ou folhetins locais que circularam pela cidade não temos conhecimento.
Como o tema do ano de 2023 foram os bustos e esculturas espalhados pela cidade, vale deixar registrado que Há 100 anos, cogitou-se no município a ereção de uma herma, muito provavelmente a primeira que temos notícia. Esta seria feita para homenagear, conforme anunciou o folhetim em 15 de abril de 1923, um ilustre cidadão brasileiro, o estadista Rui Barbosa. A futura herma seria instalada na Praça Cônego Joaquim Alves, ato que não se concretizou.
Outro projeto de monumento que ocupou as linhas da Gazeta de Batataes em 1923 foi a construção do Cristo Redentor no Rio de Janeiro que começou a ser pensado e elaborado em 1921, dentro das comemorações do Centenário da Independência do Brasil. Em 1923, foi realizado um concurso de projetos para o Cristo, vencido pelo engenheiro Heitor da Costa Silva.
O monumento icônico construído entre 1926 e 1931, em estilo Art Déco, está instalado no Morro do Corcovado, pesa aproximadamente mil toneladas e tem cerca de 40 metros de altura, o que equivale a um prédio de 13 andares. Sua estrutura e corpo – todo em pedra-sabão – foram feitos no Brasil, exceto a cabeça e as mãos que foram moldadas na França. O criador inicial do Cristo Redentor foi o desenhista Heitor de Costa e Silva, porém, o projeto contou com importante participação do artista plástico Carlos Oswald junto ao escultor francês Paul Landowski.
O maior e mais conhecido monumento brasileiro, o Cristo Redentor é considerado uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno desde 2007 e, em 2012, foi considerado Patrimônio da Humanidade pela UNESCO. É o segundo maior monumento que representa Cristo no mundo, perdendo apenas para o Cristo Rei, que fica na Polônia.
Ainda outro monumento que também mereceu as atenções da Gazeta de Batataes foi o conjunto escultórico em tributo ao médico positivista, jornalista, fazendeiro, político e anti-abolicionista, Dr. Luiz Pereira Barreto (1840-1923). A homenagem, organizada pela Sociedade de Medicina, Cirurgia de São Paulo (atual Academia de Medicina de São Paulo), da qual Pereira Barreto foi fundador e primeiro presidente, contou com a colaboração de diversas entidades e pessoas, inclusive de alguns batataenses, como Dr. Thales de Almeida, Dr. José Garcia de Barros e a própria Prefeitura de Batatais.
O conjunto escultórico é composto pela figura do Dr. Luiz Pereira Barreto e por duas figuras femininas relacionadas aos campos de atuação do homenageado. São elas: Higia e Ceres, deusas romanas da Cura e da Agricultura, respectivamente.
O monumento está instalado numa praça paulistana, localizada entre a Rua das Palmeiras e a Avenida São João, na Praça Marechal Deodoro, no Bairro Santa Cecília. Foi executado entre 1923 e 1928 em estilo Art Déco, pelas mãos talentosas do artista ítalo-brasileiro Galileu Emendabili.
“O conjunto escultórico é composto na parte principal da figura do médico e cientista Luiz Pereira Barreto vestindo a tradicional beca de médico, tendo ao lado – um pouco abaixo de sua figura – as esculturas femininas que representam a agricultura e a medicina, dois campos onde Pereira Barreto teve célebre atuação. Na seara da agricultura Pereira Barreto é bastante conhecido por ser o responsável pela industrialização da cerveja em São Paulo e o introdutor das primeiras safras de uvas destinadas a produção de vinho. A escultura da agricultura segura em seus braços alguns cachos de uva. Ele também é famoso por ser o descobridor do guaraná.” (in: https://saopauloantiga.com.br/monumento-a-luiz-pereira-barreto/)
A seguir, apresentamos aos leitores e leitoras outros destaques selecionados das páginas da Gazeta de Batataes para o ano de 1923.
DESTAQUES GERAIS
‘Soares Junior’, foi colocado sobre a sepultura do professor – proprietário do Externato e Internato Soares Júnior – poeta e jornalista José Joaquim da Costa Soares Junior no Cemitério Municipal, um túmulo elaborado por Salvador Suzana & Filho por meio de subscrição popular lideradas por Gustavo Simioni, Major Alfredo Vianna e Joaquim de Morais. (GB, 11/02/1923)
A estação de ferroviária local esteve nas pautas do jornal. Depois de várias reclamações e inúmeras solicitações da população, a nota ‘Mictorio e privada na estação ferroviária desta cidade – a reforma deste edifício público’, noticiou a Companhia Mogiana que iria providenciar para a estação local, mictório e vasos sanitários, que não existiam na construção original (GB, 11/02/1923). Porém a construção de fato desses espaços deu-se no mês de setembro do mesmo ano (GB, 15/09/1923)
A primeira edificação da estação de ferro local pertencente à ‘Companhia Mogiana’ passou por reformas e pinturas em geral, com ampliação de sua plataforma para aproximar os comboios das áreas de embarque e desembarque. (GB, 29/04/1923)
Em 1923, Batatais ao que parece não promoveu grandes festividades carnavalescas. Nenhuma notícia além da indicada ao lado. (GB, 11/02/1923)
‘Candidatura do dr. Altino Arantes’, com este título, o artigo apresenta um movimento em prol de uma nova candidatura do batataense Dr. Altino Arantes (1876-1965) ao cargo de presidente (governador) do estado de São Paulo, situação já ocupada por este ilustre político entre 1916 e 1920. A candidatura para governador de SP não ocorreu, mas o político foi eleito deputado federal por SP, em diversos mandatos: 1906-1911; 1921-1930; 1946-51. (GB, 04/03/1923)
Sobre os setores comerciais e industriais da cidade, os editoriais não poupavam críticas ao raso desenvolvimento, incitando os capitalistas locais a investirem no progresso da cidade com a criação de indústrias mecanizadas de maior porte.
“Que tem a cidade commercial e industrialmente? Somos nesse particular, um povo sem trabalho, adistricto a um meio inerte, isto é, subtrahido dolorosamente da vida productiva, enérgica e laboriosa. Quem entra em Batataes, desde logo vê a nossa completa nulidade no terreno do commercio e da industria. O contraste é perfeito: cidade bem cuidada, limpa e hygienica, mas afastada de grandes e nobres iniciativas – de emprehendimentos capazes da nossa riqueza e, portanto, de nosso progresso.” (GB, 15/07/1923)
A discussão, ao que parece, gerou resultados: em novembro, o jornal anunciou que a cidade teria uma fábrica de tecidos graças à iniciativa de alguns ‘nobres cavalheiros’ como o coronel Manoel Victor Nogueira, o Major Antonio Cândido Alves Pereira, entre outros, fato porém que já vinha sendo ventilado desde 1914. (GB, 18/11/1923)
‘Exposição Internacional do Centenário da Independência – prêmios conferidos a expositores desta cidade’. Com sede no Rio de Janeiro, a exposição do Centenário da Independência do Brasil (1822-1922) teve inicio no dia 07 de setembro de 1922 e se prolongou até julho de 1923 e tinha como principal objetivo apresentar o Brasil rumo ao progresso, ciência e tecnologia, para além de suas reservas e belezas naturais.
A exposição do Centenário contou com a participação de dois moradores da cidade de Batatais. Esses expositores locais receberam prêmios de acordo com a categoria na qual participaram: ao italiano Carmine Defelicibus (chegou ao Brasil aos 16 anos em 20/03/1902) foram conferidas medalhas, de prata pelo par de rédeas e trelas e de ouro pelos chicotes; ao austríaco Emygdio Bradaschia (chegou ao Brasil por volta de 1891) foi conferida a medalha de prata, pela cafeteira de metal. (GB, 15/07/1923)
Com o título ‘Villa Federal – a venda lotes de terreno em Planaltina’, a nota indicou “a presença na cidade de um agente autorizado para a venda de lotes de terrenos no Planalto Central Goyano, – onde futuramente será construída a nova capital do Brasil. O sr. Altamiro Corrêa tem vendido muitos lotes de terreno em cidades vizinhas, e aqui não duvidamos que tenha bom acolhimento, dada a seriedade do negócio”. (GB, 12/08/1923)
Foi destaque a morte do ‘Marechal Hermes da Fonseca’, militar e ex-presidente do Brasil (1910-1914), falecido em Petrópolis, estado do Rio de Janeiro, aos 68 anos, vitimado por uma sincope cardíaca, em 09 de setembro de 1923. (GB, 16/09/1923)
“Sua esposa Nair de Teffé, mandou edificar para o marido imponente túmulo no Cemitério de Petrópolis, com um retrato e os dizeres: “Aqui jaz o grande soldado Marechal Hermes da Fonseca, vitimado pelos desgostos de sua violenta e injusta prisão efetuada aos 7 de julho de 1922”. Sobre a pedra com o retrato e a inscrição edificou uma coluna grega partida ao meio, significativa da quebra da vida sob pressão política. Quando deixou o poder, em 1914, Hermes da Fonseca envolveu-se em diversos incidentes políticos, entre eles a Revolta do Forte de Copacabana (1922), que o levou à prisão por seis meses. Libertado, retirou-se para Petrópolis, onde morreu poucos meses depois, em setembro de 1923.” (in: https://wikimapia.org/36229910/pt/T%C3%BAmulo-do-Marechal-Hermes-da-Fonseca)
‘Feliz deligência – Prisão de dois terríveis criminosos’. Com este título, o jornal a Gazeta de Batataes notificou que as autoridades policiais batatenses conseguiram após sete anos de busca, capturar o “célebre assassino Alfredo Alves de Bessa, autor da morte de Antonio Militão, facto ocorrido nesta cidade, á avenida Dr. Rebouças, em 1916. Após brilhante trabalho de investigações e pesquisas, conseguido com intelligencia e perspicácia, as nossas autoridades, em companhia de 14 soldados e um agente policial, partiram desta cidade, em automóveis, na noite do dia 28 do mez findo com destino á Fazenda do Banco, do sr. Waldemiro da Silva Braga, propriedade essa vizinha a que se achava o homicida. Dessa fazenda a diligência seguiu a pé rumo ao abrigo do referido criminoso, que é a propriedade agrícola Sant’Anna. Sem a menor dificuldade e sem que o criminosos reagisse, as nossas autoridades deram fim á sua incumbência, trazendo preso não só Alfredo de Bessa, mas também José Felício Sant’Anna, ainda conhecido por José Vicente e José Barreto, pronunciado na comarca de Rio Preto como autor da morte do sitiante Joaquim Luiz. (…)” (GB, 02/09/1923)
Em outubro, o criminoso Alfredo José Alves de Bessa, foi condenado por um júri popular há 30 anos de reclusão, por crimes inclusos no artigo 294 do código penal de 1890. (GB, 21/10/23)
Transcrevemos aos leitores o crime, como foi noticiado pela imprensa em 15/10/1916:
”Seis tiros de revolver – Morte da victima – Criminoso reincidente – Motivo frivolo – Fuga do assassino – Domingo à tarde, cerca das desoito horas, foi a nossa pacata população surprehendida com a noticia de um crime hediondo e barbaro, commettido em uma das ruas mais movimentadas de nossa cidade. Dadas as circumstancias, hora e logar em que se deu o crime, e mesmo a impossibilidade do criminoso reagir visto haver descarregado a arma homicida na infeliz victima, devia a sanguinolenta fera estar a estas horas segregada da sociedade, expiando o seu delicto no carcere. Infelizmente, porem, dentre as innumeras pessoas que assistiram o facto, nenhuma siquer houve que, num impeto de indignação, effectuasse a prisão do perigoso assassino, entregando-o à justiça. Pela segunda vez o temi- vel Alfredo de Bessa levanta o braço assassino para tirar a vida a um infeliz preto e, agora, em pleno centro de cidade, aos olhos estupefactor de dezenas de pessoas. Mas, passemos ao facto. Alfredo Alves de Bessa é um moço de seus 25 ou 26 annos, que passou o melhor tempo de sua mocidade no carcere. De indole perversa, o jovem assassino commetteu seu primeiro crime, sem motivo que o justificasse, em 7 de junho de 1909, desfechando 9 tiros de carabina contra o pardo de nome Belmiro Joaquim de Souza. Submettido a julgamento, foi condemnado a 10 annos e 6 mezes, dada a sua menoridade. Appellada da sentença para o Tribunal de Justiça do Estado, este, por unanimidade, confirmou-a. Mais tarde foi a pena imposta a Alfredo de Bessa commutada para 7 annos, pelo sr. Presidente do Estado, que, passados dois annos, generosamente transformou a commutação de pena em perdão. Livre, parecía que o promettedor assassino estivesse regenerado, pois foi viver no seio de sua familia, neste municipio, e delle ninguem mais se lembrava. É muito certo, porem, que por mais que procuremos disfarçar o lobo em cão, a simples vista de um cordeiro o trahe. O mesmo aconteceu a Bessa. A sua regeneração não passava de um vulcão coberto de cinzas, prompto a explodir. Assim é que desde sabado o assassino encontrava-se hospedado no restaurant, ou melhor, na casa de tolerancia mantida pelo individuo Ramiro José Dias, nesta cidade, á Avenida dr. Rebouças. Nesse dia Ramiro proporcionava aos seus frequentadores um baile, e, durante elle, Bessa apaixonou-se por uma trigueirinha, hospede também da casa, e continuou o seu idillio até o dia seguinte. Domingo à tarde, palestravam em uma das salas do restaurant diversos clientes, entre elles o preto Antonio Militão, quando passa a trigueira Maria José Dulcinéa de Bessa. Antonio Militão, sem calcular as consequencias funestas do seu impatico acto, afaga os cabellos da decahida dizendo: ‘que belleza’. A Dulcinéa zanga-se, revolta-se, atira-lhe algumas amabilidades e corre a avisar Bessa, seu amante, da afronta de que acabava de ser victima. Este não se faz esperar e, vindo ao encontro do galanteador, o insulta e com elle sahe á rua. Uma vez nesta, Antonio Militão, advinhando, talvez, a ferocidade do seu antagonista, procura fugir, mas, ao segundo passo que dá, recebe em plena nuca e pelas costas um tiro que lhe atravessa o craneo, Cambaleando dá mais um ou dois passos e cahe de bruços. Bessa, como uma fera faminta, atira-se sobre a sua indefeza e moribunda victima e descarrega-lhe, a queima-roupa, as cinco balas restantes. Em seguida carrega novamente o revolver e a passos, como o mais feliz burguez, retira-se, sem ser incommodado. Avisada a policia, esta comparece algum tempo depois, dá as providencias necessarias, fazendo remover o morto para o necroterio da cadeia e mandando uma escolta ao encalço do assassino que não que não foi encontrado. Em poder da victima, na cintura, foram encontradas uma garrucha e uma faca. 0 criminoso continua foragido e o inquerito em andamento.” (GB, 15/10/1916)
Com o título ‘Tufão’, a nota informou que a cidade sofreu alguns estragos em muros e casas com a passagem de um ‘violento tufão’ em nossa cidade. “Felizmente, o vendaval durou poucos minutos. Nossa população não se recorda de vento tão forte e tempestuoso como esse de sexta-feira.” (GB, 14/10/1923)
Numa sociedade onde Há 100 anos ainda se discutia o condenável hábito de cruzar de pernas das mulheres e o uso do pó de arroz em público em artigos de jornais (GB, 02/09/1923), mulheres como a feminista, acadêmica de Direito e batataense Diva Nolf Nazário publicava o livro ‘Voto Feminino e Feminismo’, primeiro do gênero no Brasil.
O livro faz uma compilação do que foi discutido no Brasil sobre os direitos políticos da mulher durante os primeiros anos da década de 20 e narra a saga da própria autora na tentativa de realizar seu alistamento eleitoral em São Paulo e sua luta pelo sufrágio feminino.
Durante os anos de 1922 e 1923, a feminista publicou em diversos jornais paulistas, inclusive na Gazeta de Batataes e em jornais de outros estados brasileiros artigos em defesa do voto feminino no Brasil, que só viria a acontecer pela primeira vez em 1928; sendo primeira eleitora do Brasil, a sufragista Júlia Barbosa, membro ativa da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino.
Nas primeiras edições da Gazeta de Batataes de 1923, a população do Bairro do Castelo aparece solicitando uma ‘Caixa Postal’ na Praça Municipal (GB, 23/01/1923). Em dezembro, a população do Castelo solicitou a construção de um ‘Posto Policial no Bairro do Castelo’. Conforme o artigo, o governo municipal ao abrir uma rua entre a Praça Municipal (atual Praça Fernando Costa) e o largo da Igreja Santa Cruz, teria condições de doar um terreno para o governo do Estado, para ali se construir o dito posto policial. Ao que tudo indica este nunca foi construído. (GB, 15/12/1923)