Por Vergílio Oliveira
Respondendo com sabedoria aos mais diversos assuntos, entre polêmicas e opiniões, nesta edição o nosso convidado é o Pároco e Reitor no Santuário Senhor Bom Jesus da Cana Verde, Padre Pedro Ricardo Bartolomeu. Natural da cidade de Brodowski, nascido no dia 15 de outubro de 1977, filho de Valentim Carlos Bartolomeu e de Vera Lúcia Lopes Bartolomeu, irmão de Rita Cristina Bartolomeu Lorencini e de Maria Letícia Bartolomeu Violim. Padre Pedro foi ordenado diácono no dia 14 de março de 2003 e Padre no dia 02 de maio de 2004. Assumiu a paróquia do Senhor Bom Jesus da Cana Verde no dia 6 de janeiro de 2008, portanto, completou 11 em Batatais. Confira:
Jornal da Cidade de Batatais – Após a Igreja Matriz ter se tornado Santuário Senhor Bom Jesus da Cana Verde o número de fiéis tem aumentado?
Padre Pedro Ricardo Bartolomeu – Por desígnio de Deus a Paróquia, bicentenária, Senhor Bom Jesus da Cana Verde de Batatais tornou-se Santuário Arquidiocesano no dia 25 de fevereiro de 2015, ou seja, tornou-se lugar propício para o encontro com Deus e Dele receber as mais abundantes graças.
Paróquia é um termo canônico utilizado para delimitação territorial de um grupo de pessoas orientados por um pároco, isto é, por um padre com as funções de governar, santificar e ensinar. Já o termo matriz é unicamente administrativo, ou seja, é o lugar onde está a administração econômica, social e pastoral de uma paróquia. Santuário é um termo unicamente religioso que designa lugar próprio para manifestação do Sagrado e do encontro da criatura com o Criador.
O povo Católico é muito fervoroso e, consequentemente, a frequência no Santuário tem aumentado.
JC – Existe o desconhecimento por parte da população do que vem a ser um ‘Santuário’?
Padre Pedro – Sim, infelizmente não há clareza entre os católicos dos termos utilizados pela igreja e muito menos de sua abrangência espiritual.
JC – A matriz, hoje Santuário, historicamente é referência como ponto turístico de Batatais? Como conciliar a Igreja como espaço cultural e religioso?
Padre Pedro – Sim, a cidade de Batatais nasceu, cresceu e se desenvolveu no entorno da igreja Bom Jesus, por isso a cultura, a arte, a arquitetura urbana e a tradição fazem parte da sua história.
A Igreja reconhece que a arte e o belo, em todas as suas dimensões, são manifestações do Divino, desde que o artístico e o cultural não profanem o sagrado.
Não podemos nos esquecer nunca que, em 2014, o atual Santuário foi dedicado, sagrado e proclamado, liturgicamente, casa, morada de Deus; não é um lugar qualquer, é um espaço sagrado.
JC – Existe a segurança adequada para o Santuário, que abriga o acervo valiosíssimo de Cândido Portinari?
Padre Pedro – Sim, existe. O templo é monitorado por câmeras de segurança, sistema de alarme, presença 24h da Guarda Civil Municipal e sistema de combate a incêndio.
JC – Por ser Santuário e principal ponto turístico de Batatais, a Igreja vem recebendo a atenção da Prefeitura, no que diz respeito à manutenção e limpeza? Há necessidade de reformas na estrutura?
Padre Pedro – Tanto o Santuário como as telas de Portinari e a praça Cônego Joaquim Alves Ferreira são bens tombados pela Prefeitura Municipal, pelo estado e pela união, porém não recebemos nenhuma ajuda governamental, mantemos todo o patrimônio com doações dos fiéis, quermesses e campanhas.
A permanência, 24h, no templo, foi um acordo feito entre a Prefeitura Municipal, igreja e ministério público. Às segundas-feiras, realiza-se, de forma geral, a limpeza do Santuário, realizada por duas funcionárias mantidas pelo Santuário e por um funcionário cedido pela Prefeitura.
Agora, quando se fala em estrutura do Santuário não se pode pensar, como muitos pensam, somente no alicerce e nas paredes da igreja, mas em todo o conjunto de obras, objetos e atividades que compõem a vida do Santuário. No tocante ao prédio é necessário haver reparos no reboco e na pintura externa, mas para isso há um projeto em andamento nos órgãos competentes do estado e da união. Quanto à estrutura religiosa e pastoral estamos nos adequando ao ritmo de um Santuário. No que se refere a estrutura da praça e atividades que acontecem nela existe uma necessidade urgente de restauro, readaptação, adequação à realidade de centro de cidade e de patrimônio tombado. Urge que se respeite o espaço sagrado e tombado.
JC – Qual sua opinião sobre a atual situação das áreas próximas ao Santuário. Como a praça e a tradicional Rua do Comércio. Os espaços estão recebendo os cuidado e atenção necessários?
Padre Pedro – O centro da cidade já sofre com os problemas de cidade que cresceu bastante: durante a semana, no período diurno muito movimento com todos os transtornos que o mesmo acarreta; aos finais de semana e no período noturno total esvaziamento com todos os perigos que o mesmo traz consigo. Portanto, os problemas hodiernos são mais de cunho antropológico, cultural do que político, estrutural.
JC – Há muitos comentários de que nos fins de semana, durante a noite e madrugada, muitos jovens usam bebidas alcoólicas e entorpecentes na Praça Cônego Joaquim Alves. O senhor tem informações sobre isso? Como combater esse problema?
Padre Pedro – Sim, tenho. O problema é mais grave do que se imagina. O número de usuários de entorpecentes e de álcool nas propriedades particulares e festas é superior ao número daqueles que frequentam a praça. Mas os que frequentam a praça para fazer uso de entorpecentes e álcool são, a maioria, menor de idade e causam insegurança para os demais frequentadores. A solução está na reestruturação familiar, educacional e humana.
JC – Há alguns anos o senhor concedeu uma entrevista comentando que a Praça Cônego Joaquim Alves era utilizada como cemitério, onde era comum famílias enterrarem seus parentes próximo à igreja, portanto, se trata de solo sagrado. O senhor confirma essa informação? Acredita que ainda há restos mortais de séculos no local?
Padre Pedro – Confirmo o que eu disse. De 1820/21 a 1853/58, o espaço que hoje compreende a praça Cônego Joaquim Alves, praça do Santuário e quarteirão atrás do Santuário foi cemitério, no qual estão sepultados todos os nossos fundadores e primeiros moradores da nossa cidade. O monumento construído ao lado da casa paroquial é justamente para homenagear essas pessoas.
JC – Qual a sua opinião sobre a realização de eventos festivos e montagem de parques de diversão na Praça do Santuário?
Padre Pedro – Acredito e defendo a ideia de que já está na hora de eventos e festividades serem realizados em lugar apropriado, para maior comodidade e também preservação do bem tombado, principalmente a preservação do Santuário. A cidade cresceu, as festas cresceram é preciso crescer, também, a mentalidade e a criatividade.
Por duas vezes eu concordei, em caráter experimental, com a montagem do parque de diversões na praça, inclusive na primeira vez, no ano de 2017, eu fui colaborador e incentivador, mas percebi que a partir da segunda montagem, a praça não é lugar de parques e shows. Além dos danos causados à praça, provoca a desestabilização da estrutura religiosa do Santuário. Portanto, não sou favorável a parques e eventos na praça, inclusive a festa do padroeiro promovida pela prefeitura
JC – Como o senhor avalia a atual administração municipal?
Padre Pedro – Atualmente Batatais passa pelos mesmos problemas que a maioria dos municípios brasileiros, os políticos tem boa vontade, mas as possibilidades de ação são poucas.
JC – O avanço da tecnologia e o acesso a aparelhos que permitem navegar com conexão à internet com facilidade de pesquisa e comunicação tem afastado as pessoas das religiões?
Padre Pedro – A causa do afastamento das pessoas da religião continua sendo o mesmo pecado de Adão, a autossuficiência, a pseudo ideia de que não precisamos de Deus, o individualismo e a falta de comprometimento com o outro, com o social. As relações virtuais são comprometedoras, porém não podemos nos esquecer das transformações que as relações humanas reais vem sofrendo.
JC – Quando a internet faz bem e quando faz mal?
Padre Pedro – Acreditamos que a criação não terminou, não está pronta, que Deus faz novas todas as coisas, ao longo da história, para o bem do homem, mas o homem sem saber fazer bom uso dos bens que lhe são oferecidos, converte tudo para o mal. O uso da tecnologia, da internet, faz bem, desde que sejam utilizadas para conduzir o homem à salvação, que é Cristo Jesus.
JC – O senhor tem acompanhado a crescente divisão dos homens em grupos sociais como forma de defesa e luta contra preconceitos e exclusões? A que ponto isso pode ser prejudicial na evolução do ser humano e de seus direitos?
Padre Pedro – Nós não estamos em uma época de mudança, mas sim em uma mudança de época, em que a sociedade humana tenta descobrir ou redescobrir a razão de sua existência e o seu fim, porém, nesta luta está se perdendo valores, costumes e padrões. Estamos em um período em que se fala muito em desconstrução sem saber o que desconstruir; o homem está se reduzindo a viver apenas de seus instintos primatas e inconsequentes, é o período do vale tudo pelo prazer e bem estar.
Quando me refiro a instinto primata, estou me referindo ao prazer em satisfazer suas necessidades primárias: comida, bebida e sexo. O homem precisa sair de si e buscar uma razão para sua existência fora de si. O homem não é só matéria, só social, ele é também espiritual, transcendente e tal dimensão tem sido esquecida. Essa ideia já foi defendida por Viktor Frankl.
JC – Essa mudança de comportamento reduz a fé e o contato do homem com Deus?
Padre Pedro – Certamente sim. Os movimentos religiosos, religiões, segmentos espiritualistas estão fazendo um movimento inverso de espiral religioso que tem a função de girar, partindo de um ponto em torno de um eixo, para cima, em busca de algo. O ponto de partida e chegada deveria ser Deus, o eixo central Jesus Cristo, o espiral o homem que busca a perfeição e a força que o move, que o faz girar é o Espírito Santo. No inverso citado, o ponto único tornou-se o homem, girando, girando para baixo, em torno dele mesmo atraído pela força que ele mesmo gera, ou seja, o material. As religiões, seitas e segmentos religiosos precisam retomar a função de ensinar o homem a transcender.
JC – Por ser diferente de algumas gerações atrás, a educação aplicada pelos pais em seus filhos dentro dos lares atualmente está falhando? O que fazer?
Padre Pedro – Infelizmente a educação e o cuidado que os pais deveriam passar para os filhos estão sendo terceirizados. Percebemos que os bebês, crianças e adolescentes conhecem muito mais o cheiro dos educadores e cuidadores do que o dos próprios pais que, para suprirem tal carência, permitem excesso de liberdade e mimos. A maioria dos pais conhece muito mais as carências de suas atividades do que as carências, defeitos e qualidades dos filhos. A saída é a reestruturação familiar.
JC – O que a Igreja Católica está fazendo para atrair os mais jovens para os eventos religiosos?
Padre Pedro – A igreja não tem e não pode ser só de velhos ou só de jovens, ela é mãe do começo ao fim da vida dos seus fiéis. Assim como uma mãe não muda de personalidade para agradar o filho, a igreja também não deve mudar para atrair os mais jovens. Com toda certeza a igreja deve agir e falar de acordo com as exigências do seu tempo, mas não é a igreja que deve mudar, nós é que devemos nos adaptar a ela, pois ela é mãe e mestra da verdade.
JC – Qual a sua opinião sobre a cidade de Batatais?
Padre Pedro – Batatais é uma cidade maravilhosa, dá gosto viver aqui; cabe a cada um de nós dar o melhor que temos para que esta cidade continue sendo um lugar bom para se viver.
JC – Tem algo que o senhor queira colocar que não lhe foi perguntado e que seja relevante?
Padre Pedro – Nada mais, apenas agradecer pela oportunidade de me expressar, pelo carinho e consideração que tem para comigo. Para finalizar, desejo tudo de melhor e uma longa existência a este jornal. Muito obrigado.