/Ecos da 2ª Guerra Mundial: mais batataenses envolvidos no conflito

Ecos da 2ª Guerra Mundial: mais batataenses envolvidos no conflito

Por LS e AB

Fiéis leitores e leitoras, chegamos à nossa última publicação do ano! Para esta edição compartilhamos uma pesquisa especial e inédita relacionada à participação batataense na 2ª Guerra Mundial (1939-1945).

Durante nossos estudos no Centro de Documentação da 2ª. Guerra Mundial Cap. Enf. Ref. da FEB Altamira Pereira Valadares, sobre o conflito mundial e a participação de combatentes batataenses, nos deparamos com uma dupla surpresa que ora compartilhamos: a existência de mais dois participantes do ‘esforço de guerra’ ligados a Batatais, até então pouco ou nada conhecidos da população local – um militar da Força Expedicionária Brasileira (FEB) que atuou no palco de operações italiano e outro militar da Força Aérea Brasileira (FAB) que serviu numa base aérea norte-americana no Brasil durante o conflito, especialista em mecânica de dirigíveis.

Quanto ao militar da FEB, trata-se de um combatente que pertenceu ao 6º Regimento de Infantaria de Caçapava/SP, conhecido também como Regimento Ipiranga: o Major FRANKLIN QUEIROZ, à época 1º Sargento.

1º Sargento Franklin de Queiroz, data provável: 1945. Acervo Família Queiroz

Quem deu ‘vida’ ao soldado batataense desconhecido, foi um dos filhos deste ex-combatente da FEB, o jornalista Maurício de Queiroz, um verdadeiro guardião da memória do pai e de outros ex-combatentes da FEB, na cidade de Caçapava/SP.

Conforme noticia Maurício de Queiroz, seu “pai não voltou à vida civil, continuando a carreira militar após o conflito mundial, chegando à patente de Major”. O filho elucida que “tinha ciência que a cidade de Batatais não dispunha de informações sobre seu pai, o Major Franklin Queiroz.”

Ainda segundo o filho, seu “pai saiu de Batatais com 16 anos de idade, morando em Bauru, Araraquara, Ribeirão Preto e depois veio servir o Exército em Caçapava, sede do então 6º Regimento de Infantaria. Aqui [Caçapava] permaneceu até meados de 1964, sendo transferido para o 2º Batalhão de Saúde, no bairro de Cambuci na capital paulista, onde ficou até ir para a reserva, em 1967. Faleceu em 30 de Abril de 1968 e foi sepultado no Mausoléu da FEB de Caçapava.”

O descortino da trajetória de vida do Major Franklin de Queiroz, reforça o orgulho que temos em apresentar mais um bravo combatente local participante da 2ª Guerra Mundial!

Da esquerda para a direita – 2º. Sgto Franklin Queiroz, 2º. Sgto Jorge Falcão e soldado desconhecido – San Paolo Denza, 1945 – Acervo Maurício Queiroz
2º Sgt Franklin Queiroz no plano mais elevado, em Porreta Therme, local do QG da FEB na Itália, em 1944 – Acervo Maurício de Queiroz
Major Franklin de Queiroz (Batatais, 1916 – Caçapava, 1968), data provável: década de 60 – Acervo Maurício de Queiroz

Nome de Guerra e Identificação: Queiroz – 2G 86521

Procedência Militar: 6º RI

Função no conflito: 2º SGT

Data do Embarque: 1º escalão, 02 de julho de 1944 – Unidade de Embarque: USS Gen Mann

Data do retorno: 18 de julho de 1945 – Unidade de Retorno: USS Gen Meigs

Participação em batalhas: todas as batalhas com o 6º RI – Massarosa (16/9/1944); Camaiore (18/9/1944); Monte Prano (26/9/1944); Fornacci (6/10/1944); Galicano (7/10/1944); Barga (11/10/1944); San Quirico (30/10/1944); Monte Cavalloro (16/11/1944); Monte Castello (21/2/1945); S. Maria Villiana (4/3/1945); Castelnuovo (5/3/1945); Montese (14/4/1945); Paravento (15/4/1945); Monte Maiolo (19/4/1945); Rivela (20/4/1945); Zocca (21/4/1945); Formigine (23/4/1945); Collecchio (27/4/1945); Castelvetro (28/4/1945); Fornovo (28/4/1945)

Condecorações: Medalha de Campanha na Itália e vários elogios dos superiores 

Situação no final da década de 60: Serviu como capitão, no 2º Batalhão de Saúde, no bairro de Cambuci, na capital paulista, indo para a reserva, no posto de Major, em junho de 1967

Homenagem em Caçapava: Foi homenageado pela Prefeitura de Caçapava, com a outorga de seu nome, para importante via do município

Filiação e irmãos: Filho de Jeremias de Queiroz e Olívia Maria de Queiroz, agricultores,  sendo os irmãos: Antônio, Luzia, Jorge, Joaquim (Quincas) e Maria, todos falecidos

Data/Local nascimento: 27 de junho de 1916 – Batatais/SP – em área rural na divisa entre Batatais e Franca

Estado Civil e filhos: Casado em fevereiro de 1944, com Rosemira de Araújo Queiroz, tiveram os seguintes filhos: Vera Lúcia, Ana Lúcia, Carmen Lúcia, Maria Lúcia, Maurício, Franklin Junior (falecido), Marcos, Eliane Lúcia e Paulo Rogério (falecido)

Profissão que exerceu antes da carreira militar: Ferroviário

Data do falecimento: 30 de abril de 1968

Causa Morte: Infarto Agudo do Miocárdio.

Local sepultamento: no Mausoléu da FEB em Caçapava/SP, onde recebeu as homenagens militares póstumas de praxe

Colaborador: Mauricio de Queiroz (Para mais informações: https://taiadaweb.com.br/1o-sgt-feb-franklin-queiroz-arriscando-a-vida-pela-patria/).

Além deste ‘novo’ ex-combatente, o Major Franklin Queiroz, integrado à lista de participantes de Batatais a lutar no palco de operações na Itália; acrescentamos ainda, outro brasileiro participante do esforço de guerra na 2ª Guerra Mundial, servindo no Brasil e há anos morador na cidade de Batatais.

Quanto ao militar da FAB, trata-se do 1º Tenente da Aeronáutica Reformado WALTER CARDOSO, à época integrante do corpo de militares da FAB que patrulhava a costa do litoral brasileiro em busca de submarinos e aeronaves inimigas, ou seja, das forças do Eixo, durante o conflito.

Walter Cardoso, aluno da Escola Técnica de Aviação, em São Paulo

Em janeiro de 1941, durante a 2ª Guerra Mundial, foi criado no Brasil, o Ministério da Aeronáutica e seu braço militar, Forças Aéreas Nacionais, logo em seguida, designada com o nome que possui até os dias atuais – Força Aérea Brasileira (FAB). Com a formação do Ministério da Aeronáutica, foi feita a junção da Aviação e do Correio Naval e Militar. Além disso, a FAB tornou-se responsável pela Aviação Civil, que antes era do Ministério de Viação e Obras Públicas. 

Para o novo Ministério da Aeronáutica, Getúlio Vargas nomeou o civil – advogado e político -, Dr. Joaquim Salgado Filho que administrou a nova pasta com empenho e eficiência. Durante sua gestão, investiu na reorganização do setor aéreo brasileiro e na formação de pilotos e oficiais militares, instrutores e especialistas aeronáuticos para atender às necessidades de um ministério ainda incipiente e atuar no conflito armado mundial, mais especificamente na campanha da Itália com o 1º Grupo de Aviação de Caça (1º GAvCa) em conjunto com a 1ª Esquadrilha de Ligação e Observação (ELO). Este grupo pertenceu à Artilharia Divisionária, e que tinha o objetivo de fazer trabalhos de regulação do tiro de artilharia, de observação do campo de batalha e de missões de ligação integradas à FEB.

Para tal, foram instaladas estruturas e aparelhamentos visando a formação de uma aeronavegação brasileira, desde bases aéreas às escolas de aviação, com o apoio constante dos EUA. Uma dessas estruturas foi a criação da Escola Técnica de Aviação (ETAv), em São Paulo, que proporcionava a formação de pessoal especializado em mecânica de aviação e aeroespaço, conveniada à organização estadunidense, John Paul Ridle Aviation Tecnical School.

A ETAv visava, num curto espaço de tempo, a formação de técnicos e especialistas em manutenção de aeronaves da própria FAB. Para a parte técnica, os responsáveis foram os americanos, e a formação militar ficou a cargo do Ministério da Aeronáutica; assim, os formandos eram considerados sargentos.

O espaço para o funcionamento da ETAv foi cedido pelo governo paulista ao Ministério da Aeronáutica. O local ficava na Mooca, nas instalações da antiga Hospedaria dos Imigrantes, hoje Memorial do Imigrante, casarão que pertenceu à família do Visconde de Parnaíba.

O Brasil, a partir do mesmo ano de 1941, ainda em sua posição de neutralidade sobre o conflito armado, além de criar suas próprias bases aéreas, cedeu após negociações, bases militares para as Forças Aéreas e Navais Norte-Americanas, como apoio eficaz na guerra aérea na Europa, Ásia e África.

Em 1942, após a declaração oficial de guerra às potencias do Eixo e organização de suas Forças Armadas, o Brasil precisava, além de soldados para a guerra propriamente dita, de pessoal especializado em proteger suas próprias fronteiras, principalmente por conta do iminente perigo de submarinos alemães rondando a costa litorânea brasileira. Para isso foram utilizados os Oficiais da Reserva da Aeronáutica formados no centro da Base Aérea do Galeão, e os formados nas escolas técnicas e centros das bases aéreas de São Paulo e de Porto Alegre.

A FAB contou também com o apoio norte-americano na proteção aérea da costa litorânea brasileira, de Porto Alegre até Belém, a fim de proteger a navegação marítima brasileira contra possíveis atos bélicos praticados por submarinos alemães e italianos.

Em 1943, estava em formação técnico-militar na ETAv, WALTER CARDOSO, convocado a servir numa das bases aéreas estabelecidas em território brasileiro, ocupando a função de ‘Guarda de Pressão de Dirigíveis’ para a patrulha do litoral atlântico brasileiro.

O Tenente Reformado da Aeronáutica Walter Cardoso é conhecido em nossa cidade por sua brilhante carreira acadêmica como professor-pesquisador de História, e seu envolvimento com várias instituições, entre elas, com a sua amada Sociedade Recreativa Escola de Samba do Castelo.

O ilustre Prof. Dr. Walter Cardoso, com 102 anos de vida, concedeu-nos a honra de rememorar o período que serviu na FAB, de 1944 a 1962. Em especial, compartilhou algumas de suas memórias ligadas ao período em que atuou na Base Aérea de Santa Cruz/RJ, como especialista em mecânica de dirigíveis.

Foi na base militar Norte-Americana de Santa Cruz no Rio de Janeiro, durante a 2ª Grande Guerra, entre os anos de 1944-1945, que o jovem sargento Walter Cardoso, então com 23 anos, foi ser instrutor de mecânica da FAB e tinha como uma das responsabilidades, a manutenção de dirigíveis, mais conhecidos como Zeppelins.

Walter Cardoso, falou inicialmente, sobre as bases americanas no Brasil durante a 2ª Guerra Mundial: “dada à importância geográfica brasileira, isto é, sua proximidade com a África, suas dimensões continentais e seu posicionamento estratégico, o Brasil, como aliado dos Estados Unidos, permitiu que estes criassem aqui importantes bases aéreas. Assim, instalou-se em Natal uma base aérea que passou a ser conhecida como “Trampolim da Vitória”, pois ela servia para que o arsenal de guerra americano passasse rumo à Europa, fazendo escala em Dacar, na África. Desta forma, diversos aviões americanos foram levados à Inglaterra, inclusive por pilotos brasileiros. Além de Natal, os americanos também construíram outras bases como a de Recife e de Belém do Pará. Nesta última, instalou uma unidade brasileira com aviões de patrulha Catalina Hidros. Outra base, também brasileira foi criada no Galeão, Rio de Janeiro, com aviões Catalina Anfíbios. Ainda no Rio de Janeiro, na Base Aérea de Santa Cruz, foi criada uma Base Americana, onde servi entre 1944 e 1945.”

Quanto à formação de pessoal técnico especializado, Prof. Walter expôs que “a guerra exigiu que o Brasil unisse a aviação do Exército e da Marinha, criando-se então a FAB. Naturalmente, havia a necessidade de formação de pessoal técnico para a nova instituição. Para tal, fez-se um acordo com a instituição America Embry-Riddle Aeronautical University, a maior e mais respeitada universidade especializada em aviação e aeroespaço dos Estados Unidos. Esse acordo permitiu a vinda de uma escola que funcionou em São Paulo. Nesta escola militar, os instrutores técnicos eram americanos e os instrutores procedentes do Exército Brasileiro, ministravam instrução militar”

Formatura de Walter Cardoso, como 3º Sargento da Aeronáutica, 1944

“Antes de minha entrada nessa escola especializada, eu era ferroviário e cursei o Madureza Ginasial, atual EJA. Prestei exames para ingresso nessa escola profissionalizante e lá fiz o curso técnico de aviação. Uma vez aprovado, fui promovido à 3º Sargento e enviado para a base de dirigíveis de patrulha da Marinha Americana, na Base Aérea de Santa Cruz (BASC), no Rio de Janeiro”.

Hangar do Zeppelin de Santa Cruz – O hangar para Zeppelin é um dos poucos ainda existentes no mundo e é considerado um dos mais conservados. A edificação foi tombada como patrimônio material brasileiro pelo IPHAN em 1998. https://pt.wikipedia.org/wiki/Hangar_do_Zeppelin
Certificado de Curso de Treinamento em “Estrutura de Aeronave”, de Walter Cardoso, oferecido pela Marinha Americana

 “Lá havia também o 2º Grupo de Caça, pilotos treinados pelos americanos para pilotarem os ‘tigres voadores’ da então Birmânia. Em Santa Cruz já havia, na Base Americana, um grupo de brasileiros com os quais fiz curso de dirigíveis e neles voei. Como curiosidade, registro que minha equipe voava às quintas-feiras das 7h ao meio-dia no dirigível K110. Graças a Deus passei a guerra incólume, isto é, não matei ninguém…”

 “Lembro-me que os norte-americanos promoviam eventos festivos e tinham bons programas de rádio, que nós brasileiros também éramos envolvidos. Gostava do talk show de Bob Hope, humorista inglês, radicado nos EUA.”

Dirigível americano da Base Aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, 1944 – Acervo Walter Cardoso

 Terminada a guerra, os pracinhas regressaram vitoriosos da Itália, os americanos que estavam no Brasil, ‘go home’ e eu e meus companheiros fomos transferidos para a Base Aérea de Belém do Pará, onde permaneci de 1945 a 1947, por aqueles rios e igarapés prestando assistência às populações ribeirinhas e indígenas.

Servi na FAB em diversas unidades, como por exemplo, Guaratinguetá e Congonhas, onde exerci inúmeras funções. Concomitante ao trabalho, fiz a graduação em História. Fui transferido para a reserva em 1962, por extrema necessidade, quando aconteceu uma tragédia em família. Desde então, passei a viver no mundo civil.

Valeu a pena? Como diria Fernando Pessoa. Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena.”

Sargentos Mecânicos da Base Aérea de Belém em data festiva – ajoelhado da 3º da direita para a esquerda, Walter Cardoso – Acervo pessoal WC

Depois de sair das Forças Armadas Brasileiras, Walter Cardoso trabalhou no mundo corporativo em São Paulo e região. Aproveitou e cursou mais uma graduação, fazendo parte da 1ª turma do curso Ciências Físicas e Biológicas do Mackenzie/SP, e fez o mestrado em História das Ciências, compondo a 1ª turma da PUC/SP.

Depois de algum tempo, decidiu dedicar-se ao magistério. Nesse ínterim, veio morar, nos idos da década de 70, com a família em Batatais, graças a sua esposa e também professora e pesquisadora de História, Clotilde de Medina Cardoso. Tem filho, netos e bisnetos nascidos em Batatais.

Em nossa região, ministrou aulas no curso de História da UNESP/Franca. Possui vasta pesquisa e produção sobre a História de nosso município, publicadas principalmente na Revista Amicus. Em 2015, no Bicentenário da Paróquia do Senhor Bom Jesus da Cana Verde, lançou o livro ‘Bom Jesus da Cana Verde dos Batataes – das bandeiras à cidade’.

Enfim, um aclamado cidadão batataense!

Prof. Walter Cardoso – foto recente – Acervo familiar