/Covid-19: Dimas Covas afirma que número de infectados pode ser dez vezes maior

Covid-19: Dimas Covas afirma que número de infectados pode ser dez vezes maior

Nessa semana, mesmo com uma agenda repleta de compromissos no Centro de Contingência do novo coronavírus em São Paulo e no Instituto Butantan, onde é o diretor responsável, o batataense Dr. Dimas Tadeu Covas, um dos médicos e pesquisadores mais respeitados do país, respondeu prontamente as perguntas que fizemos sobre a evolução da pandemia.

JC – Bem Dr. Dimas, inicialmente gostaríamos de saber sobre a Vacina contra o Covid-19, anunciada recentemente pelo Governo do Estado, na parceria com empresa farmacêutica chinesa. Quando ela estará disponível? Como as pessoas poderão se voluntariar?
Dr. Dimas Covas: Nesse momento a vacina está em processo de desenvolvimento clínico. Isto significa que ela foi aprovada nas fases iniciais de testes e agora precisa ser aplicada a um grande número de pessoas, no caso 9.000 voluntários. O processo de seleção de candidatos é controlado pelos centros de pesquisa que serão em número de 12 distribuídos pelo Brasil. Quando os testes começarem, os critérios de seleção serão divulgados e as pessoas poderão se candidatar se atenderem aos requisitos do estudo.

JC – A parceria Butantan e Sinovac de fato tirou o Brasil do ‘fim da fila’ da vacina?
Dr. Dimas Covas: Sim. O Brasil com este acordo passou para a vanguarda do desenvolvimento da vacina para o coronavírus. Trata-se de uma das três vacinas que está mais adiantada no mundo e o Brasil poderá ser um dos primeiros países a ter a vacina disponível para uso na sua população.

JC – Levantamento feito nas principais bases de dados sobre ensaios clínicos do mundo mostra que 153 remédios estão sendo testados em estudos com pacientes que contraíram Covid-19. O número demonstra o esforço de todo o mundo para o combate à doença. Como médico e pesquisador como vem acompanhando esse trabalho?
Dr. Dimas Covas: A pandemia do novo coronavírus trouxe um grande desafio para o mundo. Em pleno século XXI, enfrentamos uma das piores epidemias dos últimos 100 anos, com mais de 6 milhões de pessoas infectadas e mais de 500 mil mortos. O mundo se uniu para o desenvolvimento de vacinas eficientes e seguras contra este vírus mortal. A ciência mundial se mobilizou com o que tem de melhor para fazer uma vacina rapidamente e ajudar a combater de forma eficiente o vírus. Vejo com muito otimismo todo o trabalho que esta sendo feito e com o fantástico aprendizado que estamos tendo.

JC – Batatais, diferente de muitas cidades paulistas, flexibilizou o comércio um mês após o início da quarentena e, recentemente, foi obrigada por determinação judicial a seguir o Decreto Estadual. Como cidadão batataense, qual sua avaliação sobre esse posicionamento?
Dr. Dimas Covas: A pandemia é muito grave e atinge principalmente as pessoas idosas e aquelas portadoras de outras doenças. Não existe nenhum remédio que seja efetivo nesse momento e a vacina vai demorar um pouco. A única forma que temos para combater o espalhamento do vírus é por meio do isolamento social, principalmente das pessoas com sintomas da doença e aquelas pertencentes aos grupos de risco. Quando o isolamento social é flexibilizado o vírus circula mais e infecta maior número de pessoas e, consequentemente mais pessoas ficam doentes e morrem. O Decreto Estadual visa a manter a quarentena e disciplinar o combate à epidemia. O sistema de cores funciona como um termômetro que indica o risco a gravidade da situação em determinada região. O fato de Batatais estar localizada em uma região vermelha significa que o vírus não está sob controle e a epidemia está avançando mais rapidamente. Manter a circulação do vírus sob controle somente é possível se as pessoas permanecerem em suas casas e se deslocarem o menos possível, evitando aglomerações e contatos com outras pessoas, além de usarem as máscaras e tomares as medidas higiênicas como lavagem de mãos e assepsia em geral.

JC – Nossa cidade chegou a marca dos 90 casos notificados. Uma elevação exponencial no último mês. A sua recomendação para o isolamento mais intensificado segue com esses números?
Dr. Dimas Covas: Sim. O aumento do número de casos indica que o vírus está circulando mais rapidamente na população. Para cada caso identificado, outros 10 casos foram infectados o que significa dizer que se 90 foram identificados nesse momento, existem cerca de 900 circulando com o vírus e assim por diante. Se não forem tomadas medidas de isolamento o número de casos continuará a aumentar nessa proporção.

JC – Com poucos casos em março os brasileiros estavam apreensivos e se isolando. Agora, com mais de 1 milhão de casos, temos shoppings abertos, transporte urbano lotado e uma queda acentuada no índice de isolamento. A população e os governantes não entenderam a gravidade da doença?
Dr. Dimas Covas: De uma forma geral, há muita informação contraditória a respeito da gravidade da epidemia. Os governos estaduais e os municípios estão se esforçando para atenuar os efeitos nocivos da infeção. No nível federal a compreensão da gravidade já não é a mesma. Ainda temos autoridades referindo que a epidemia é apenas uma gripe. A população, principalmente a população mais desfavorecida economicamente, não tem recebido apoio efetivo para permanecer em isolamento social por muito tempo. A ajuda do governo federal demorou a chegar e ainda não chegou a todos. Aqueles que dependem do trabalho diário para a sobrevivência não tem como se isolar ou parar de trabalhar o que, por consequência, leva ao crescimento da epidemia. A situação é complexa e não tem solução simples. A solidariedade nesse momento é fator fundamental. Se ajudarmos uns aos outros no sentido de diminuir a circulação apenas para aquela situação onde é imprescindível conseguiremos controlar de forma mais eficiente o vírus. Se não conseguirmos, a epidemia vai crescer e pode ameaçar nosso sistema de saúde. Muitos casos de COVID-19 nos nossos hospitais podem comprometer a capacidade de atendimento de outras doenças e elevar o número de mortes. Essa situação é muito perversa, mas o que podemos dizer é que todos seremos atingidos pela epidemia, alguns pelo vírus diretamente e outros pelas suas consequências sejam econômicas ou sociais.

JC – O desencontro entre as medidas tomadas pelos governos estaduais e o Ministério da Saúde, com interferência política, nitidamente tem atrapalhado o controle da disseminação do coronavírus do Brasil. Como reverter esse quadro e qual sua perspectiva para os próximos meses?
Dr. Dimas Covas: A polêmica política nesse momento não ajuda, cria uma discussão paralela e tira o foco do combate ao vírus. Combater a epidemia é muito difícil. Em muitos países desenvolvidos, mesmo com unidade nacional, a epidemia fez grandes estragos. No Brasil, a falta de união, nesse momento, joga a favor do vírus. A reversão desse quadro somente seria possível se as diversas instancias de poder, federal, estaduais e municipais se unissem para um combate efetivo.

JC – O enfrentamento direto a pandemia, seja no diagnóstico ou mesmo no Centro de Contingência, é um dos principais desafios que já travou em sua vida?
Dr. Dimas Covas: Já enfrentei outros desafios como o tratamento de certos tipos de câncer e o enfrentamento de outras epidemias como a epidemia de AIDS. Mas uma epidemia gigantesca como essa que se apresenta com milhões de pessoas infectadas e milhares de mortos é o maior desafio de saúde do nosso país nos últimos 100 anos, comparável somente à epidemia de gripe espanhola em 1918 e seguramente o maior desafio de minha vida como médico e cientista.

JC – A sua mensagem a população batataense:
Dr. Dimas Covas: Os tempos presentes são muito difíceis para todos nós. Essa epidemia é um desastre de grandes proporções e vai afetar a vida de muitas pessoas de forma permanente. A cada um de nós cabe a responsabilidade de combater esse vírus diariamente até que ele desapareça. Isso vai acontecer, mas ainda vai levar alguns meses. Até lá temos que nos conscientizar da gravidade da epidemia e nos comportarmos de forma preventiva obedecendo às medidas de isolamento social, uso de máscara e as medidas de higiene preconizadas. Espero que a nossa cidade consiga vencer esse desafio. Se todos nos unirmos nesse esforço, no final teremos poupado muitas vidas e sofrimento.