Vivemos dias difíceis. A pandemia veio pesar ainda mais a realidade já vivida por situações problemáticas relacionadas a economia, questões ambientais preocupantes e irreversíveis, intolerância acerca de diferenças raciais, culturais, sexuais e afetivas, e questões mais marcantes sobre os desentendimentos entre humanos, realidades que sinalizam a descaracterização do que se sabia sobre vínculos familiares etc. Assim, antes da pandemia tínhamos graves problemas, essa não é o único problema.
Neste texto, a pretensão é a abordagem por outros pontos, uma vez que existe grande abordagem diária pelos meios de comunicação de massa das citações anteriores.
Nosso enfoque é sobre as pessoas que perderam a vida e as outras que são ameaçadas de contágio pela pandemia em curso, mas não trataremos de todas as pessoas, apenas das boas pessoas, daquelas que morreram, porém em vida fizeram e se vivas fazem a diferença positiva nos grupos familiares, de amigos, profissionais e sociais em que viveram ou vivem.
Neste mundo capitalista, os endinheirados, os detentores de status e poder são, em grande parte das vezes, os mais respeitados e portanto, aturados e não queridos. Queridos são os bons, os doces, aqueles que mesmo após mortos continuam a viver através das pessoas que foram marcadas por seu amor e tocadas por suas bondades. Assim, apenas os bons são imortais verdadeiramente, os demais são lembrados, no entanto, em momentos em que assuntos negativos vêm à tona, e exemplos ruins são citados, após, voltam rapidamente ao esquecimento. Os bons, são eternamente lembrados, não morrem, tornam-se invisíveis apenas, e eternos.
Adoro o poema de Carlos Drumond de Andrade – Almas perfumadas, leia-o e perceba como ele retrata com maestria uma pessoa amada e viva, mesmo não mais vivente neste plano terrestre
Esses amados e amadas exalam cheiro de passarinho, de sol, de estrelas e de flor. Ao lado delas, sentimo-nos alegres, felizes e vivenciando as melhores sensações, voltamos à infância, permitimo-nos sonhar acordados, “o tempo é outro”. A vida fica feliz e parece que estamos no colo de Deus, “ao lado delas, a gente sabe
que os anjos existem e que alguns são invisíveis”. Aos seus lados, experimentamos as sensações mais gostosas, doces e de prazer, parece “manhã de Natal”. “Ao lado delas, a gente não acha que o amor é possível, a gente tem certeza”.
Quando estamos ao lado delas, a gente se sente em um ambiente alegre e cheio de paz, recebemos carinho e suas palavras são de aconchego e acolhimento, tocam nossas almas como se fosse um cafuné, com elas, rimos e sorrimos como há tempos não fazíamos, revivemos o menino ou a menina arteira e feliz que um dia fomos. Pessoas que possuem almas perfumadas falam conosco através de seus silêncios e olhares, caminham em cadência a nosso lado e não nos cobram pelo nosso ritmo. Essas pessoas são ouvintes dispostos a nos receber para outros encontros.
Suas presenças nos fazem recordar que Deus existe e que é importante que continuemos a rir, este é um dos momentos em que Deus está presente.
A exemplo do que nos diz Lya Luft sobre a morte de seu filho, é natural parecer que algo tenha se apagado nas pessoas que perderam outras, queridas e amadas, isso é intraduzível e indizível, porém, a autora enfatiza: “A melhor coisa que você pode fazer para homenagear quem se foi é tentar viver direito de novo sua vida. Não pode deixar que a morte destrua tudo que tem de bom”.
Essa é nossa singela homenagem para as pessoas que morreram, antes ou durante à pandemia, e para suas famílias consanguíneas ou estendidas e escolhidas. Para essas pessoas amantes, seus amados (as) não morreram, suas almas perfumadas farão com que sobrevivam nelas e através delas. Nunca serão numeráveis, numerados serão os não amados verdadeiramente, os de almas perfumadas, viverão para sempre.
Pense nisso!