/Recriar Educação 11-01-2025

Recriar Educação 11-01-2025

Cuia


Lindaura, a recepcionista do analista de Bagé ― segundo ele, “mais prestimosa que mãe de noiva” ―, tem sempre uma chaleira com água quente pronta para o mate. O analista gosta de oferecer chimarrão a seus pacientes e, como ele diz, “charlar passando a cuia, que loucura não tem micróbio”. Um dia entrou um paciente novo no consultório.

― Buenas, tchê ― saudou o analista. ― Se abanque no más.
O moço deitou no divã coberto com um pelego e o analista foi logo lhe alcançando a cuia com erva nova. O moço observou:
― Cuia mais linda.
― Cosa mui especial. Me deu meu primeiro paciente. O coronel Macedônio, lá pras banda de Lavras.
― A troco de quê? ― quis saber o moço, chupando a bomba.
― Pues tava variando, pensando que era metade homem e metade cavalo. Curei o animal.
― Oigalê.
― Ele até que não se importava, pues poupava montaria. A família é que encrencou com a bosta dentro de casa.
― A la putcha.
O moço deu outra chupada, depois examinou a cuia com mais cuidado.
― Curtida barbaridade. ― Também. Mais usada que pronome oblíquo em conversa de professor.
― Oigatê.
E a todas estas o moço não devolvia a cuia. O analista perguntou:
― Mas o que é que lhe traz aqui, índio velho?
― É esta mania que eu tenho, doutor.
― Pos desembuche.
― Gosto de roubar as coisas.
― Sim.
Era cleptomania. O paciente continuou a falar, mas o analista não ouvia mais.
Estava de olho na sua cuia.
― Passa ― disse o analista.
― Não passa, doutor. Tenho esta mania desde piá.
― Passa a cuia.
― O senhor pode me curar, doutor?
― Primeiro devolve a cuia.

O moço devolveu. Daí para diante, só o analista tomou chimarrão. E cada vez que o paciente estendia o braço para receber a cuia de volta, ganhava um tapa na mão.

 

 

Velhas Árvores


Olha estas velhas árvores, mais belas
Do que as árvores moças, mais amigas,
Tanto mais belas quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas…
O homem, a fera e o inseto, à sombra delas
Vivem, livres da fome e de fadigas:
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.
Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo. Envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem,
Na glória de alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!